CALEM-ME A CRIANCINHA QUE NÃO CONSIGO MASTIGAR
Por João Miguel Tavares
ESTAVA MIGUEL SOUSA TAVARES NA TVI a comentar a nova Lei do Tabaco quando da sua boca saltou esta pérola: o fumo nos restaurantes, que o Governo quer limitar, incomoda muitíssimo menos do que o barulho das crianças - e a estas não há quem lhes corte o pio. Que bela comparação. Afinal, o que é uma nuvenzinha de nicotina ao pé de um miúdo de goela aberta? Vai daí, para justificar a fineza do seu raciocínio, Sousa Tavares avançou para uma confissão pessoal: "Tive a sorte de os meus pais só me levarem a um restaurante quando tinha 13 anos." Há umas décadas, era mais ou menos a idade em que o pai levava o menino ao prostíbulo para perder a virgindade. O Miguel teve uma educação moderna - aos 13 anos, levaram-no pela primeira vez a comer fora.
Senti-me tocado e fiz uma revisão de vida. É que eu sou daqueles que levam os filhos aos restaurantes. Mais do que isso. Sou daquela classe que Miguel Sousa Tavares considerou a mais ameaçadora e aberrante: os que levam "até bebés de carrinho!". A minha filha de três anos já infectou estabelecimentos um pouco por todo o país, e o meu filho de 14 meses babou-se por cima de duas ou três toalhas respeitáveis. É certo que eles não pertencem à categoria CSI (Criancinhas Simplesmente Insuportáveis), já que assim de repente não me parece que tenham por hábito exibir a glote cada vez que comem fora - mas, também, quem é que acredita nas palavras de um pai? E depois, há todo aquele vasto campo de imponderáveis: antes de os termos, estamos certos de que vão ser CEE (Crianças Exemplarmente Educadas), mas depois saltam cá para fora, começam a crescer e percebemos com tristeza que vêm munidos de vontade própria, que nem sempre somos capazes de controlar.
O que fazer, então? Mantê-los fechados em casa? Acorrentá-los a uma perna do sofá? É uma hipótese, mas mesmo essa é só para quem pode. Na verdade, do alto da sua burguesia endinheirada, e sem certamente se aperceber disso, Miguel Sousa Tavares produziu o comentário mais snobe do ano. Porque, das duas uma, ou os seus pais estiveram 13 anos sem comer fora, num admirável sacrifício pelo bem-estar do próximo, ou então tinham alguém em casa ou na família para lhes tomar conta dos filhinhos quando saíam para a patuscada. E isso, caro Miguel, não é boa educação - é privilégio de classe. Muita gente leva consigo a prole para um restaurante porque, para além do desejo de estar em família, pura e simplesmente não tem ninguém que cuide dos filhos enquanto palita os dentes. Avós à mão e boas empregadas não calham a todos. A não ser que, em nome do supremo amor às boas maneiras, se faça como os paizinhos da pequena Madeleine: deixá-la em casa a dormir com os irmãos, que é para não incomodar o jantar.
«DN» 8 Mai 07 - [PH]
Etiquetas: JMT
5 Comments:
Gosto de ouvir o Miguel S. Tavares, mas é mais pela forma de falar (desassombrada) do que pelo que diz, pois debita, com frequência, coisas que não verifica previamente, como:
Afirmar que a estação da CP de Lagos não tinha sala-de-espera - quando tem, e bem grande; garantir que não há lugares de estacionamento nas Avenidas Novas - quando os parques estão a menos de 60%, etc.
Miguel Sousa Tavares é um romancista que não sabe geografia, como provou na sua obra "Equador", em que coloca as ilhas de S.Tomé e Prícipe a sul de Angola.
Enfim, um trapalhão...
É mais uma pérola, como tantas a que Miguel S. Tavares nos tem habituado, é caso para dizer "calem-me a criançinha..."
Enfim...
Miguel Sousa Tavares até tem razão.
O que acho lamentável é que já não haja educação e fulaninhos como este Joãozito a quem nunca ensinaram "regras" de viver em sociedade, como a que recomenda não levar criancinhas para certos locais. O palhacito acha-se cheio de graça. Devia era ir comer para a casota do cão.
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