22.5.07

O CÃO DE MOURINHO E O FUTEBOL DO CHELSEA

Por João Miguel Tavares
MUITO A CUSTO, o Chelsea lá ganhou mais um título, e José Mourinho levantou orgulhosamente seis dedinhos para as câmaras de televisão - uma falangeta por cada taça que embolsou nos últimos três anos. Foi a maneira que arranjou para abreviar o currículo e exibi-lo a Roman Abramovich, que embora estivesse no melhor camarote de Wembley a apoiar a equipa parece que anda pelos cantos a fazer contas de cabeça - correr com Mourinho ou não, eis a questão. A quantidade de títulos que o português conseguiu em tão pouco tempo é invejável, com certeza, mas o seu salário opíparo, os falhanços na Liga dos Campeões e o dinheiro que enterrou em jogadores de produtividade mais do que duvidosa obrigam o patrão russo a coçar as meninges. E, aqui entre nós, o homem tem uma certa razão. Sim, eu sei, Mourinho é fantástico, o melhor treinador do mundo, o Special One e blá, blá, blá. Mas digam-me: alguém se lembra de um único jogo memorável do Chelsea nos últimos dois anos? Um único, um só, abandonado e viuvinho, se faz favor. É que eu não me lembro. José Mourinho é mestre em pôr a rapaziada vestida de azul a correr que nem galgos pelo campo, a jogar como uma equipa unida com Super Cola 3, competitiva até mais não e com rios de suor a despencar daquelas testas. Mas o (bom) futebol é muito mais do que pressão alta e correrias. Mourinho ganhou, pôs o Chelsea no mapa do futebol à escala planetária, encheu capas de jornais, fez entrar muitas libras nos cofres do clube. Só que Abramovich não está no Chelsea para ganhar dinheiro. Para ganhar dinheiro, ele tem o petróleo. Se quiser engrossar a sua conta bancária, compra mais um poço - não um clube de futebol. Abramovich investiu no Chelsea pelo prestígio e porque gosta de bola. E bola da boa, convenhamos, é coisa que não se tem visto para os lados de Stamford Bridge. E aí, boa parte da culpa é mesmo de Mourinho. Porque o Chelsea é, em primeiro lugar, a sua distinta pessoa. Nenhum jogador é tão famoso quanto ele (basta ver as fotografias nos jornais), e as aventuras do seu cão ilegal, perseguido pela polícia por falta de vacinas e fugido do país em jacto privado, fazem correr mais tinta do que qualquer vitória no campeonato. De tão special, o Special One secou tudo à sua volta. O Chelsea de Mourinho é uma máquina sem alma e com muito pouca inventividade - falta talento em estado puro, aquela espécie de talento que abunda nas linhas avançadas do Manchester ou do Barcelona. Com os milhões do petróleo, ele já poderia ter junto de sim uns Ronaldos, um Messi, ou até mesmo um Deco. Mas não tem. E por isso a ausência de vacinas do seu cão é mais notícia do que a qualidade da equipa que treina. O brilho de Mourinho empalidece o futebol do Chelsea. Foi isso que Abramovich já percebeu. E percebeu bem.
«DN» de 22 Mai 07 - [PH]

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