Tordesilhas da denúncia
AS DIRECTIVAS dadas pelo Ministro da Justiça no sentido de apelar à denúncia de actos de corrupção na Administração Pública chocaram meio-mundo, desde os sindicatos até ao cidadão-comum.
De facto, o problema da «denúncia de ilícitos» é um daqueles (muitos) com que a nossa sociedade, traumatizada por 48 anos de ditadura e pides-informadores, lida mal - e, com frequência, em termos contraditórios.
No entanto, como pode valer a pena encarar o assunto de frente, passemos por cima do tema da corrupção e vejamos mais longe, a partir de dois casos bem concretos:
1º-Há algum tempo, a propósito de violência doméstica que pode levar à morte de crianças, discutiu-se se alguém, conhecedor em exclusivo de uma situação concreta, deverá ou não denunciar o caso atempadamente por forma a salvar a vítima. Qual a atitude correcta?
2º-E, já agora, um caso ainda mais concreto: recentemente, uma velhinha foi assaltada, por esticão, mesmo à porta da minha casa. A minha mulher tomou nota dos dados do carro, eu avisei a PSP, os ladrões foram apanhados em menos de meia-hora e a bolsa devolvida. Fizemos bem?
De um modo geral, as pessoas que confronto com estes dois exemplos acham que a denúncia não só se justifica como é uma obrigação cívica.
Então por onde passa a linha divisória que, nas nossas cabeças, faz com que a denúncia de um determinado ilícito seja aceitável ou, ao invés, pareça um exercício de "bufaria repugnante"?
Palpita-me que a resposta não é fácil.
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