A Lepra do Poder Local
Por J. L. Saldanha Sanches
A FRONTEIRA ENTRE O GASTO PÚBLICO LEGÍTIMO e a mera e simples apropriação de fundos públicos é um dos pressupostos do Estado bem organizado; está totalmente diluída no modo como se estrutura o poder local.
A FRONTEIRA ENTRE O GASTO PÚBLICO LEGÍTIMO e a mera e simples apropriação de fundos públicos é um dos pressupostos do Estado bem organizado; está totalmente diluída no modo como se estrutura o poder local.
No poder local: a estrutura é ultra-democrática: há um executivo eleito proporcionalmente e um mini-parlamento. Os vereadores da oposição podem ser comprados com a atribuição de pelouros. Abundam os assessores e outras sinecuras.
Para completar o regabofe, as empresas municipais.
A vantagem de António Costa na sua candidatura para Lisboa é que se pronunciou sobre este sistema quando fez uma Lei das Finanças Locais que constitui um primeiro (e tímido) passo para reduzir o esbanjamento municipal.
Uma vinculação muito útil quando se candidata à Câmara de Lisboa, a região mais rica do país e por isso a última a poder reivindicar ao “estado” (leia-se: ao resto do país) seja o que for.
A gestão de Lisboa só exige duas coisas: rigor e coragem política.
Aquilo que corrói Lisboa é o saque legal de fundos públicos (assessores, empresas municipais) e um grau dissolvente de corrupção.
Se a DGCI arranjasse tempo e recursos para fiscalizar “as manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados” daquela gente e da sua parentela faria mais estragos que a investigação criminal (apesar das contas em paraísos fiscais que acompanham as grandes obras).
Nas eleições que aí vêm Carmona que deveria ser o símbolo da dissolução administrativa tem uma vantagem importante: é arguido.
Os eleitores adoram arguidos. É a forma actual do voto de protesto.
Isso leva-nos à fase da dissolução dos consensos mínimos – a punição de quem é apanhado com a mão nos dinheiros públicos para que as instituições possam funcionar – o que está a criar alinhamentos atípicos.
É significativo que o PSD tenha escolhido Fernando Negrão como seu candidato. No fundo é a aliança de convicções invocada por Jaime Gama na sessão da Assembleia da República dedicada à corrupção. Uma aliança de convicções que provém da percepção generalizada que a lepra da corrupção está a impedir o normal funcionamento das instituições.
«Expresso» de 2 de Junho de 2007Etiquetas: JLSS
4 Comments:
No Público-online de hoje:
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O fiscalista Saldanha Sanches desvalorizou hoje o pedido do advogado José António Barreiros para uma investigação criminal na sequência das suas afirmações à "Visão" e considerou que este quer mostrar-se como "grande defensor da Justiça".
Em entrevista à revista "Visão" na passada quinta-feira, José Luís Saldanha Sanches, especialista em Direito Fiscal e mandatário financeiro da candidatura de António Costa (PS) à Câmara de Lisboa, afirmou que "nas autarquias da província há casos frequentíssimos da captura do Ministério Público (MP) pela estrutura autárquica".
"Há ali uma relação de amizade e cumplicidade, no aspecto bom e mau do termo, que põe em causa a independência do poder judicial", disse Saldanha Sanches.
As declarações, que vão ser analisadas quarta-feira em reunião do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), já tinham sido consideradas "gravíssimas" pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP).
Saldanha Sanches reiterou hoje à Lusa as afirmações feitas à revista "Visão", salientando que "a excessiva proximidade com as autarquias pode ser um obstáculo à imparcialidade".
Quanto ao pedido de José António Barreiros para uma investigação criminal na sequência das suas afirmações, disse que o advogado "está a tentar mostrar-se como o grande defensor da justiça".
"O que José António Barreiros diz é que todos os magistrados deste país são arguidos por minha causa, por causa do que eu disse", afirmou.
Sobre a reunião do CSMP disse que aquele organismo "está no seu direito" e acrescentou que não tem de ser informado antecipadamente.
O advogado José António Barreiros apresentou na segunda-feira no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) uma denúncia criminal contra incertos, pedindo ao procurador adjunto que investigue os alegados crimes de denegação de justiça e prevaricação, corrupção passiva e abuso de poder subjacentes às declarações de Saldanha Sanches.
Em entrevista ontem à SIC Notícias, José António Barreiros considerou que Saldanha Sanches "denunciou crimes" e que, perante esse facto, "ninguém poderia ficar indiferente", sustentando que "o sistema jurídico tem de tomar a sério" as declarações do fiscalista".
Para o fiscalista Saldanha Sanches, tudo não passa "de uma cabala de advogados pouco esclarecidos".
Também na segunda-feira o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) considerou "gravíssimas as declarações de Saldanha Sanches à revista "Visão" e pediu na semana passada a intervenção do Procurador-Geral da República, Pinto Monteiro.
O SMMP refere que Saldanha Sanches aludiu ao facto de ser frequente nas autarquias da província, haver "captura do Ministério Público pela estrutura autárquica".
No entender do SMMP, tais declarações "lançam um injusto e intolerável clima de suspeição sobre a generalidade da magistratura do Ministério Público que, imperativamente, terá de ser dissipado".
Sobre a posição do SMMP, Saldanha Sanches refere apenas que as suas palavras "chocam com as intenções do sindicato que estão mais preocupados com os seus sócios do que com os obstáculos a uma justiça eficiente".
A reacção de José António Barreiros às declarações de JLSS é típica:
Se eu disser (o que toda a gente sabe ser verdade) que «há fiscais corruptos na Câmara tal», já se sabe que vai aparecer alguém a dizer duas coisas:
1º- «Essa acusação é um insulto a TODOS os fiscais!»
2º- «Se sabe que há fiscais corruptos, porque é que não os denuncia?»
São argumentos chochos, pois é como eu dizer que «no metro há carteiristas», e vir alguém argumentar:
«Está a chamar carteiristas a TODOS os utentes do metro!» ou «Se sabe que há carteiristas no metro, porque é que não os denuncia?»
Sucede que o que está em causa são factos do conhecimento comum.
Normalmente, os que se armam em virgens ofendidas são os que, de facto, estão "ligados ao assunto"...
Veja-se como Isaltino de Morais, Fernando Ruas ou o advogado de Fátima Felgueiras reagem se alguém diz o óbvio: «há, por aí, muita corrupção nas autarquias».
Como já se previa (v. comentário anterior), cá está...
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«A Procuradoria-Geral da República, num breve comunicado hoje divulgado, refere que o CSMP decidiu, por unanimidade, "solicitar ao professor doutor Saldanha Sanches que indique quais os casos de violação de deveres profissionais ou deontológicos por parte de magistrados do MP que em concreto conheça, a fim de serem tomadas as medidas que se mostrem adequadas"».
Seria de perguntar ao CSMP se pode garantir que não conhece nenhum caso de violação dos deveres profissionais ou deontológicos por parte de magistrados do MP
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