23.11.07

A QUADRATURA DO CIRCO

O país dos Almerindos
Por Pedro Barroso
NÃO SE LHE CONHECIA OBRA DE CULTURA, drama ou romance. Não se lhe conhecia curriculum nem de cineasta, nem de vídeo amador. Não se lhe conhecia nenhuma especial sapiência em coisas de Rádio ou Televisão. E contudo.
Fundador do Partido Socialista, já foi também Presidente dos Conselhos de Administração da Agência Lusa e da Portugal Global; já foi também administrador da Caixa Geral de Depósitos e do Banco Espírito Santo; já foi também Presidente do Banco Fonsecas & Burnay e da filial portuguesa do Barclays; já foi também deputado pelo Partido Socialista e até Secretário de Estado da Administração Escolar, num governo chefiado por Mário Soares (1976/78).
Veio pois, do Banco de toda a gente, quando este acaba, para a Caixa de toda a gente, quando esta expande. Talvez como prémio.
Diz-se que, aí, houve mau entendimento com o Administrador principal. Saiu da dita CGD e logo arranjou um empregozito modesto na gestão da RTP. “Convite”, ao que parece, que é sempre como se contrata a este nível cá no burgo.
Uma surpresa para tantos homens de televisão elegíveis.
Como gestor implacável. Diz-se que é um homem de miúdos. Passe a expressão, hoje em dia equívoca e maldosa... Falo de trocos, tostões, pataqueira, entenda-se. Diz-se dos garimpeiros do cêntimo. Verificadores de contas, nunca investidores, com ordens rigorosas para poupar. Coisa que, ao que parece, sabe fazer.
Advogava que nunca deve investir-se nem em programas musicais, nem culturais, pois não dão audiências.
Foi-me dito na cara, em passados encontros, posso afirmá-lo, portanto.
Tem uma irritabilidade fácil e, contudo, tem sabido resistir a denúncias públicas das suas muitas benfeitorias, haveres, poderes, cargos e tachos. Em vão, jornais tentaram implicá-lo em tentaculares ligações. E denunciar-lhe os mil e um lugares, vencimentos e domínios. Imperturbável, o seu prestígio fica sempre incólume. De pedra e cal.
Tem defensores públicos que vêm à liça defendê-lo ao mínimo ataque.
Governar para o tostão tem sido o investimento de regime na cultura do povo. Se ele ficar progressivamente bimbo e recuado no gosto, não há problema. Imbecilize-se, mas haja pé-de-meia. O Estado assim entende a função da rádio e da televisão próprias.
E depois dá-se um fenómeno curioso – se não soubermos nem quisermos expandir o sentido crítico, a qualidade e a modernidade, o povo passa a consumir a mediocridade. E aí as audiências retornam. Bovinas mas retornam.
É o primeiro presidente da RTP a ser nomeado por um Governo e a ser reconduzido por outro Governo de outro partido. E continua dono do futuro, ao que parece.
Que ninguém o conteste. O empregado Rodrigues dos Santos que o testemunhe, pois escreve nas horas vagas e, para isso, parece que não anda a cumprir os horários. E dá com a língua nos dentes em assuntos que não deve. Está mal.
Ter tachos, afinal, é feio.
Agora, espantosamente, o homem sabe ainda mais comprovadamente de tudo. Acaba de ser nomeado presidente das Estradas de Portugal. Pimba!
Da Banca, à Televisão, às Estradas. Nem Nuno Rogeiro faria melhor.
Conclusão:
Eu quero mudar o meu nome.
Já deu entrada no cartório da minha terra que, em vez de António Pedro, quero passar a ser definitivamente, Almerindo. Apesar de um pouco teutónico, gosto muito.
Está decidido. Ponto. Não aceito menos.
É um nome muito bonito e paga demasiado bem, para lhe ficar indiferente.
Sou um óptimo gestor, o pessoal é que anda por aí distraído. Somítico, miudinho, minucioso, jacobino, avarento, agarrado, terrível. Serei tudo isso.
Tenho é andado adormecido entre o sonho e a viagem. Mas prometo reencaminhar-me de forma severa e exemplar. Aproveitem-me, por favor, desatentos indicadores e convidadores de cargos deste país. Serei excepcionalmente produtivo.
Cortiças, vinho do Porto, futebol, pescas, cereais, açúcares, azeites, banca, orquestras, televisão, ramas de petróleo, tangerinas, moda, helicópteros, qualquer coisa.
Prometo lucros. Resultados garantidos.
Como tal, mudo o nome e inscrevo-me em tudo o que for preciso.
Trigo limpo.
Ao vosso dispor. Atentamente,
Almerindo Barroso
(fica bonito, não fica?)

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3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

O que surpreende é que ainda ninguém tenha confrontado tão excelso gestor com aquela história passada com ele, na CGD, em que um consultor contratado tinha cumprido apenas 10% do trabalho e o senhor já tinha autorizado o pagamento de 90% da factura.
Se acham que é mentira, perguntem ao actual vice-presidente Maldonado Gonelha. Falava disso a toda a gente.

23 de novembro de 2007 às 12:44  
Anonymous Anónimo said...

rigor alheio com telhados de vidro em casa própria...
tudo se gere tudo se transforma diz-me qual é a tua loja e eu digo-te que convite irás receber a seguir...

24 de novembro de 2007 às 17:09  
Blogger maria_maia said...

Parabéns, Pedro!!

pela pertinência do post e por ser 28 de Novembro.

beijo

28 de novembro de 2007 às 00:28  

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