Fado Nosso
Por Nuno Brederode Santos
PASSARAM TRÊS MAGROS MESES sobre a campanha eleitoral de Lisboa. No seu decurso, António Costa expôs e reiterou o seu plano de ataque à catastrófica situação das finanças camarárias, explicitando sempre ser seu pressuposto a contracção de um empréstimo bancário para fazer face às dívidas de curto prazo, contraídas antes da sua eleição. Passaram três magríssimas semanas sobre a aprovação do plano de saneamento financeiro da câmara, o qual plasmava aquele propósito da campanha. Tendo embora defendido soluções várias para o problema, todas as forças políticas entenderam dever viabilizar a solução, sufragada, do vencedor. Repito: todas. Um universo que hoje nos parece tão enorme que até incluiu o PSD.
E, no entanto, agora que o empréstimo foi a votação na câmara e foi viabilizado por todas as demais forças políticas, os vereadores do PSD votaram contra. Instado, Menezes remeteu esclarecimentos para o secretário-geral do partido, Ribau Esteves. Este e Carlos Carreiras, o novo líder do PSD/Lisboa, vieram dizer da sua confiança no voto contrário da sua desautorizada maioria na Assembleia Municipal. Pelas seguintes razões: primeiro, porque Costa "tem de perceber que não governa a câmara com maioria absoluta" - e ninguém melhor para isso do que a maioria absoluta de uma Assembleia que se furtou politicamente às eleições e à derrota; depois, porque a segunda "tranche" do empréstimo seria um "saco azul" de 136 milhões para Costa fazer a sua "campanha eleitoral" de dois anos - mas este já se submeteu à regra de todo e qualquer pagamento ser sujeito à Assembleia Municipal. Enfim, porque, se a solução da governação das autarquias fosse contrair empréstimos, o défice disparava - e nem a autoridade moral do autarca mais endividado do País, o de Gaia, pode ser ignorada, nem o PSD consentiria numa tal maldade feita ao ministro das Finanças. Só há um caminho, acrescentou Ribau: "Fazer cedências."
"Cedências" parece ser a chave do problema assim criado. Costa tem de ceder. Em qualquer coisa. No montante, no prazo, nas regras de utilização - qualquer coisa. Porque o Sol, quando nasce, é para todos. E Menezes, mal o poder lhe caiu no regaço, começou logo a ceder. Cedeu o grupo parlamentar a Santana Lopes, confiando-lhe a visibilidade da sua principal praça-forte. Cedeu, no plano das instituições do regime, a Alberto João Jardim, defendendo uma nova Constituição (afinal Chávez não ousou tanto) e o fim do Tribunal Constitucional. Cedeu a Marco António Costa o protagonismo de uma regionalização sem referendo nem obrigação de simultaneidade, pensando mais em criar no Porto um contraponto a Rui Rio do que em como controlar depois essa dinâmica. Cedeu a Cavaco na pragmática dos pactos de regime, mudando de teoria geral quantas vezes foi preciso. Cedeu, em promessas incumpríveis, tudo o que faz a liderança de um partido, aos autarcas e aos militantes de base. Cedeu, enfim, às acusações de populismo daqueles que derrotou nas directas, fechando-se na única conduta não populista de que é capaz: a omissão, o silêncio. São cedências a mais, mas é cada vez mais tarde para lhes fechar a torneira. Tornou-se inadiável falar grosso. Chegou a hora do inimigo externo. Esse terá de ceder. E, sendo tarde para o bolchevismo e longe para o imperialismo ianque, seja o presidente da Câmara de Lisboa. Recusando-lhe todas as regras do confronto democrático. Paralisando-lhe a gestão. Privando-o dos necessários instrumentos. Lançando mão de uma maioria que, tendo suporte jurídico, é, politicamente, um sarcasmo lançado à cara dos lisboetas. E se, um dia, ele for percorrer o aqueduto, contrata-se o Diogo Alves.
E há um piedoso argumento que começou já a tentar o seu caminho: pois não sabia Costa que isto podia suceder, já que a Assembleia continuaria a ser a dos vencidos? Leia-se: a culpa é dele, que ganhou, e até de todos os que concorreram contra o PSD. É como a culpa da viúva que terá de arder na pira do defunto: pois, quando casou, não sabia? Mas sempre adianto, em pura especulação, a minha resposta: olhem que o homem sabia...
«DN» de 2 de Dezembro de 2007
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3 Comments:
Diz-nos a inteligência que as capacidades cognitivas do "homem" acerca da situação económica e financeira da Câmara no momento da decisão pela candidatura ao cargo, seriam as seguintes: ou sabia ou não sabia!, certo?! Julgo que o importante é tentar perceber as posturas políticas daí advenientes. Ou será que existe uma "3ª via"? = o poder pelo poder ou o poder numa maioria manipulante que permite encobrir, ajeitar, compor,..., no mínimo tal atitude prenuncia e anuncia no povo atento, dúvidas e desconfianças.
Como dizia a inteligente e manipuladora canção, fatalista e deprimente: "Lá vamos cantando e rindo, levados, levados sim..."
Ou ao invés, pomos a boca no trombone e começamos a desmistificar a sério esta farsa, aqui no norte conhecida pela OPERETA LISBOETA. Chiça, a Democracia não nos obriga a aceitarmos gente sem qualidade, simplesmente escravizados ao fascínio do "american way of life", logo ao IMPÉRIO DO LUCRO (ou das mais valias como agora é moda dizer; no tempo do Durão Barroso/maoísta mais-valia era um termo marxista!). Lembro que os sistemas políticos têm doenças há muito diagnosticadas, a saber: no capitalismo e no comunismo, a ditadura e na democracia, a oclocracia que significa o domínio da gentalha. Acresce na actualidade o domínio globalizante virótico.Não nos esqueçamos! Quem compreender isto e tenha a oportunidade de ser visível, ponha por favor a boca no trombone.
Oh, coitadinho do Costa! Coitadinho, que os homens maus do PSD não deixam ele salvar Lisboa. Ele, que só quer o bem de Lisboa, mesmo só, só. E Lisboa, coitadinha, cuja única solução é a contracção de um empréstimo grande, grande, para pagar as dívidas de outros empréstimos, grandes - mas mais pequeninos. O honesto e de grande, grande coração Costa, devia ouvir os senhores juristas da Deco, que desaconselham os endividados (muitos, deslumbrados e impelidos pela actual governação "de sucesso") a contrair novas dívidas para pagar dívidas anteriores. Tenho pena, mesmo-mesmo muita pena do Costa, mas também de todos os seus amigos do Governo, os quais lutam abnegadamente, sacrificialmente, pelo bem de Portugal, um país cheio de malagradecidos - salvo raras excepções como esta do Nuno Santos. Ainda bem que ainda há Santos. O que já não vai havendo são crentes. Um povo ingrato, é o que é. Eu cá, se fosse a eles (o Costa e os amigos) já não queria mais fazer o bem a esta gentalha, que eles não merecem. Eu cá, se fosse a eles, ia-me embora e deixava-os à sua sorte, e era bem feito. É que era mesmo bem feito.
Apiedado: tenha dó, mas é do PSD...
Já agora, você nem vota em Lisboa, pois não?
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