Manuel Buíça e Alfredo Costa – mártires injustiçados
Por C. Barroco Esperança
SENDO VISCERALMENTE CONTRA A PENA DE MORTE e adversário da violência, não aceito que os valores actuais, em democracia, alimentem o coro ressentido contra os regicidas de 1908 – cidadãos que mudaram o curso da história, em Portugal.
Grande parte da opinião pública desconhece o contexto do regicídio. Ignora a suspensão real da Carta Constitucional, que permitiu ao ditador João Franco encerrar o Parlamento, reprimir manifestações, fechar jornais, encarcerar grande parte da oposição republicana, e até monárquica, que se propunha degredar para Timor.
É neste contexto que os regicidas ousaram tirar a vida ao rei, sabendo que sacrificavam a sua. Não cometeram o crime nefando que os monárquicos e os sectores mais reaccionários da sociedade se incumbiram de acentuar; executaram uma sentença, imolando-se.
Alfredo Costa e Manuel Buíça foram cruelmente assassinados pela feroz polícia do ditador João Franco depois de praticarem um acto com a consciência da sorte que os esperava. Sabiam que não teriam, nem esperavam tirar, benefícios pessoais do regicídio. Queriam apenas libertar a Pátria de um ditador, eliminando um rei inapto que, ao assinar a suspensão da Carta Constitucional, perdeu a legitimidade, tornou-se cúmplice da repressão e assinou a sua sentença de morte.
Nuno Álvares Pereira, ao arrepio dos princípios da época, tomou o partido do Mestre de Avis. Depois de ter obtido largas promessas de terras, fartou-se de matar castelhanos e aguarda a santidade. É ele acusado de assassínio ou a lendária padeira de Aljubarrota? Os conjurados de 1640 mataram Miguel de Vasconcelos e ninguém lhes chama assassinos. O marquês de Pombal exterminou os Távoras e não carrega tal labéu. Nem D. Miguel, sinistro, mesmo para a época, depois de ter chacinado liberais e posto o país a ferro e fogo para usurpar o poder, é denominado assassino.
Os que odeiam Buíça e Alfredo Costa regozijam-se com D. Afonso Henriques a bater na mãe, rejubilam com o Mestre de Avis a ferir de morte o Conde Andeiro e exultam com os conjurados de 1640 a defenestrarem Miguel de Vasconcelos, depois de o crivarem de balas.
Buíça e Alfredo Costa acataram provavelmente uma decisão da Carbonária, para porem fim à ditadura de João Franco, evitarem as deportações em massa e libertarem os numerosos presos políticos. Não agiram por sectarismo ou vingança, foram agentes de uma execução com que julgaram evitar males bem maiores. Não merecem, pois, o anátema que o Estado Novo lançou sobre eles e que ainda persiste.
Não eram marginais sedentos de sangue, eram idealistas republicanos. Não eram assassinos, foram mártires da liberdade no culto dos valores de que foram arautos.
Os regicidas cumpriram o dever que a noção de patriotismo lhes impunha, nos tempos que eram, nas circunstâncias que foram, com a ditadura a legitimar a violência do acto. Foi com o Parlamento encerrado, por entre perseguições e arbitrariedades, com a liberdade cerceada e na iminência de deportações em massa, que os mártires, em nome da liberdade, imolaram as próprias vidas, sacrificando o rei e o príncipe herdeiro.
Se outro testemunho não houvesse, para julgar a nobreza de carácter e a firmeza das convicções de quem tinha a História à espera de um acto difícil e heróico, bastaria um excerto da carta escrita por Manuel Buíça, em 28 de Janeiro, dois dias antes do regicídio, com a assinatura reconhecida pelo tabelião Motta, na rua do Crucifixo, em Lisboa:
Se outro testemunho não houvesse, para julgar a nobreza de carácter e a firmeza das convicções de quem tinha a História à espera de um acto difícil e heróico, bastaria um excerto da carta escrita por Manuel Buíça, em 28 de Janeiro, dois dias antes do regicídio, com a assinatura reconhecida pelo tabelião Motta, na rua do Crucifixo, em Lisboa:
«(…) Meus filhos ficam pobrissimos; não tenho nada que lhes legar senão o meu nome e o respeito e compaixão pelos que soffrem. Peço que os eduquem nos principios da liberdade, egualdade e fraternidade que eu commungo e por causa dos quaes ficarão, porventura, em breve, orphãos».
Etiquetas: CBE
12 Comments:
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Quantas gerações serão ainda necessárias para desinfectar a memória nacional das "histórias da carochinha" do salazarismo?
Quando serão devidamente reabilitados "vencidos" como o Buíça, Gomes Freire de Andrade, ou o Gen. Norton de Matos, por exemplo, e devidamente colocados no lugar histórico que merecem os Braganças (sem excepção), a Maria da Fonte, o Marechal Gomes da Costa e, de um modo geral, todos os criminosos que sabotaram a República e permitiram o "Estado Novo"?
Para quando uma análise objectiva de todos os malefícios que advieram para Portugal da centenária aliança luso-inglesa, sobretudo a partir do desastroso Tratado de Methween? E que incluiram aspectos económicos (a impossibilidade da implantação de uma verdadeira indústria em Portugal), políticos (a Ditadura de Beresford) e militares (o Mapa Cor-de-rosa, a desastrosa participação na I Grande Guerra)?...
El Dr. Oliveira Salazar, siempre desconfió de los hijos de la Rubia Albion.......
Ó A. Castanho, és parvo ou quê???????
Tens noção da bestialidade que escreveste????????
Queres "julgar" o Afonso Costa e o Partido Republicano???????
Vai catar pulgas!!!!!!!!!!!
Bandalhho!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Ao longo dos quase 3 anos de vida que o SORUMBÁTICO já leva, tem havido, por vezes, discussões mais animadas; mas sempre com civilidade e respeito pelas opiniões dos outros.
O Carlos Esperança depois de colocar este texto no Ponte Europa tinha também de o publicar aqui.
Assassinar alguém é sempre um acto vergonhoso, mas para alguns “democratas” tudo em permitido em nome da sua liberdade, sim porque a dos outros pouco ou nada interessa.
O regicídio foi conduzido pela maçonaria com o lavar de mãos da Coroa Inglesa, nada mudou, substituíram o Rei por um Presidente, mas a miséria e a exploração continuaram.
Isto é, saiu a monarquia do poder e entrou a maçonaria. Só perdemos com a troca.
Alguns iluminados partidocratas (ditadura dos partidos), não acreditam na monarquia.
O problema não é ter um rei ou um presidente no poder. O problema é se uns e outros estão ao serviço dos exploradores ou dos explorados.
Para o autor, um assassino que actue em nome da república e/ou outros ideais de esquerda é um "puro", um "idealista". Como em seu tempo Estaline e Fidel Castro foram elogiados como revolucionários puros e desinteressados.
Tenha vergonha!
Nem mais.
O texto é todo ele um apelo ao ódio e à violência, se toda a gente pensa-se como o Esperança, andávamos aos tiros uns aos outros em defesa daquilo que acreditamos.
Não tenho procuração para defender o autor do texto - até porque ele não precisa.
No entanto, e porque o tema é deveras interessante, aqui deixo algumas questões:
Porque é que se comemora (e exalta) o assassinato de Miguel de Vasconcelos (pelos conjurados, em 1640), do Conde de Andeiro (pelo Mestre de Avis e pelo tio de Nun’ Álvares, em 1383), e tantos outros - como os cometidos por D. João II pelas próprias mãos?
Será só porque são factos antigos (que hoje achamos que foram "a bem da Nação"), enquanto o regicídio de D. Carlos foi há menos de 100 anos?
Não é verdade que os assassinatos desse tipo (embora não deixem de o ser) são actos puramente políticos, e é como tal que têm de ser encarados, analisados e discutidos - ou seja, historicamente?
Naturalmente, por um fenómeno que é recorrente em História (e humanamente compreensível), os partidários de quem os pratica consideram-nos heróis, e os partidários das vítimas consideram-nos assassinos…
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FINALMENTE - e para que não restem dúvidas sobre o que quis dizer:
O que escrevi não envolve qualquer juízo-de-valor sobre o acto concreto referido no post.
Apenas procuro recentrar o olhar sobre o fenómeno em apreço, na medida em que um regicídio (pelas suas motivações, processos e consequências) não pode ser encarado da mesma forma que o assassinato de um porteiro de discoteca.
Este comentário foi removido pelo autor.
Os assassinatos de Viriato e de Sertório tiveram as consequências conhecidas aqui por estes lados;
os de Júlio César, Nero, Calígula, Cómodo, etc., não foram menos importantes, lá para os lados de Roma;
o do arquiduque Francisco Ferdinando até despoletou a 1ª Guerra Mundial;
os de Humberto Delgado, Eduardo Mondlane e Amílcar Cabral tiveram as consequêncas que se sabe;
e houve inúmeros outros, de que se fala menos: o do presidente Carnot (de França), de Henrique IV, de Marat...
Note-se - repito! - que, com isto, não faço quaisquer juízos de valor. O que digo é que, em todos os casos, se tratou de actos violentos com pura fundamentação política e que - uns mais profundamente do que outros - mudaram o curso da História.
O que torna "diferente" o assassinato de D. Carlos (e do Infante) é a sua grande proximidade (geográfica, temporal e - até - afectiva).
De resto, e como não podia deixar de ser, em todos os casos atrás referidos os perpetradores das mortes são considerados "assassinos cobardes" ou "grande patriotas" - conforme o lado de onde o acontecimento é observado.
Sempre foi (e será) assim, o que tem toda a lógica.
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