9.3.09

Salários

Por João Paulo Guerra

A crise baixa o preço dos funerais. Portanto os portugueses não se podem queixar que não têm onde cair mortos.
MAS, DE RESTO, a vida de privações que já atormentava grande parte da população ameaça transformar-se num inferno. Em Portugal é assim: porque chove ou porque faz sol há sempre um ror de sacrifícios para os sacrificados do costume. Agora é a crise, antes era o destino.
E assim, a sugestão do dr. Silva Lopes para que se congelem os salários "normais" já começou a ter seguidores entre alguns decisores empresariais. Decisores que só ouviram o que lhes convinha da proposta do antigo governador do Banco de Portugal. Com efeito, a proposta completa, para além de ser apresentada com o generoso propósito de socorrer os desempregados, era no sentido de congelar os salários "normais" e de reduzir os mais elevados. Mas nesta segunda fase do discurso os decisores já tinham desligado os auriculares. E, deste modo, ao mesmo tempo que surgem notícias sobre os primeiros congelamentos de salários "normais", apenas uma das 30 maiores empresas - segundo notícia do Público de sexta-feira - se compromete a cortar nos salários dos gestores. O que revela que os decisores só ouviram uma parte da proposta do dr. Silva Lopes mas também que não deram cavaco às críticas repetidas do chefe de Estado.
Portugal é o campeão europeu da desigualdade. Neste país pelintra, agora mergulhado numa crise medonha e à beira da convulsão social, a Ferrari já vendeu este ano sete "superdesportivos", o que representa quase metade das vendas de todo o ano de 2008. Ou seja: para uma minoria de nababos de um país de "tanga", a crise vem de carrinho. Mas para a maioria a crise vai proporcionar carretas funerárias ‘low cost'.
«DE» de 9 de Março de 2009

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