Os Barões do Regime
Por Maria
Filomena Mónica
NA ÚLTIMA crónica falei dos ricos que ganharam as suas fortunas às claras, mas outros há, como Rui Pedro Soares, Duarte Lima, Armando Vara, Dias
Loureiro, Oliveira e Costa e Isaltino Morais, sobre quem recaem suspeitas de
corrupção ou outras formas de enriquecimento ilícito. Temos ainda o exército de
indivíduos, metidos em casos como o Freeport,
o Magalhães e a Parque Escolar, sobre o qual se abateu uma misteriosa penumbra. Isto para não falar de um tal Domingos Névoa que levou muita gente a concluir que o
melhor é jamais denunciar indivíduos corruptos.
Há zonas ainda mais cinzentas. Pode o dinheiro acumulado
ter de ilegal, o que não quer dizer que a forma como se montaram certos negócios
seja moral. Basta pensar nas PPP, que levaram a que encargos exorbitantes
recaiam sobre contribuintes inocentes – como eu, os meus filhos e os meus netos
- para se perceber o fundamento do ressentimento popular. Não só muitos
presumíveis corruptos nunca são julgados – ficando em liberdade até ao momento
em que o crime prescreve – como são aprovadas leis que, em vez de tornarem
ilegais casos de promiscuidade entre o público e o privado, permitem a pratica.
Nos últimos anos, entre deputados, ministros e empresários forjou-se um pacto
que faz com que seja quase impossível meter na cadeia quem usa a sua posição
política para enriquecer.
Como se isto não bastasse, há os salários dos políticos.
Devo reconhecer que não são particularmente elevados, embora, tendo em mente o
que a maior parte deles faz, me pareçam excessivos. Ao dinheiro que recebem,
tem de se juntar os privilégios de que auferem, tais como reformas a meio da
vida, carros espampanantes e motoristas a toda a hora. Há, finalmente, gestos
simbolicamente mortíferos. Será que, antes de ter decidido participar no
louvável esforço da minha Junta de Freguesia, no sentido de dar comida às
famílias necessitadas, a Assembleia da Republica não anteviu que a oferta dos
restos de porco preto, de gambas e de ananases, deixados pelos deputados na travessa,
são uma afronta?
Quem conheça a nossa História percebe rapidamente por que
motivo a ideia de que se pode enriquecer com o trabalho não tem raízes. Há
tempos, uma amiga minha, que dá aulas no Ensino Básico e Secundário, contou-me
o seguinte. Depois de uma prelecção aos alunos sobre a necessidade de se estudar
para subir na vida, um deles perguntou-lhe: «Ó stora onde é que se faz o
dinheiro?». Satisfeita por ter captado a sua atenção, respondeu-lhe, «Na Casa
da Moeda», após o que lhe explicou o processo de impressão e de cunhagem, um
aditamento que não pareceu interessar-lhe. A certa altura, o jovem quis saber onde
ficava a tal Casa. Ela deu-lhe a morada e repetiu que, se tivesse boas notas,
certamente que lá arranjaria um emprego. Eis o que se seguiu: «Tem razão,
stora, primeiro candidato-me, depois entro e, uma vez lá dentro, gamo o dinheiro
todo que lá houver». Não pensem que se estava a fazer de engraçadinho. Vivo num
país moralmente indigente.
«Expresso» de 7
Jul 12
Etiquetas: FM
3 Comments:
Muito bem haja, Maria Filomena Mónica, por chamar "os bois" pelos nomes.
A mim faz-me uma certa revolta haver tantos analistas e politólogos (curioso termo, este) sempre a passarem uma esponja sobre os escândalos dos poderosos, sobretudo se eles ainda não caíram (completamente) em desgraça (ou se prevê que possam não cair...). Ora, não compete a ninguém andar à cata das falhas dos políticos e mandantes, mas é dever importante exigirmos-lhes que se comportem dignamente, e fazer tudo para os afastar se não merecem o nosso respeito, logo que não procedam com retidão. E muito particularmente quando, ilegitimamente, ainda têm a distinta lata de se afirmarem de "consciência tranquila", como se nós duvidássemos disso...
Deve ser essa a razão por que temos tantos "doutores"...
E é também por isso que há certas pessoas a quem gosto de pronunciar o nome sem aquele ornamento prévio...
De resto, um dia destes ainda é capaz de haver quem proponha que a todos indistintamente se passe a chamar "doutor(a). Para facilitar...
Ou para (não) disfarçar.
Havia um café (em Coimbra, julgo eu) que tinha à porta um papel a anunciar:
«Aqui tratamos todos por Doutor».
Sim, sim Carlos Medina Ribeiro.
E na rua João Jacinto havia, na primeira metade da década de oitenta, uma padaria onde um velho coxo e obeso servia todos os jovens que iam comprar os "papo-secos", agradecendo-lhes com um sonoro e bem pronunciado:
"Muito obrigado, doutor".
E a freguesia era normalmente constituída de jovens universitários, alguns caloiros, moradores na residência de estudantes logo ali ao lado.
Riam-se alguns, não apenas os provenientes de aldeias onde cavaram batatas e pasceram cabras, dizendo que era necessário habituar quanto antes as orelhas às formas de tratamento agradáveis.
Somos assim...
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