27.9.12

Uma semana cheia de ironias

Por Ferreira Fernandes
PRIMEIRO, foi Mitt Romney a dizer que convinha que as janelas dos aviões fossem de abrir e fechar. Ele sorria mas, que importa, ele era americano e republicano, logo, burro. Gozaram-no. Valeu-lhe o New York Times vir dizer o óbvio: o homem ironizava. 
Logo a seguir, foi Madonna a dizer que apoiava Obama "negro e muçulmano." A própria logo a seguir teve de dizer, porque o escândalo já despontava, que com "muçulmano" ironizava. 
O mundo esta semana descobriu que os americanos ironizam. É um pouco tarde descobrir isso 102 anos depois de Mark Twain ter morrido. E é injusto descobrir-se ironia nos americanos só quando eles a praticam fracota, como nos dois exemplos acima. São duas ironias pequenas mas um grande passo para a Europa: aprendeu a não menosprezar os americanos. 
Quem usa ironia a torto e a direito, e mesmo só a torto, não pode ser burro. Ironia é um falar que conta com a inteligência dos outros. 
Exemplo de ironia: "A excelente dona Inácia era mestra na arte de judiar as crianças", frase de Monteiro Lobato (1882-1948), mestre brasileiro que pôs os miúdo a gostar de ler (O Picapau Amarelo é dele). Às vezes ele escrevia sério, por exemplo: "O corpo de Negrinha era tatuado de sinais, cicatrizes, vergões", do conto Negrinha, onde denunciava o que os negros sofriam. Agora, há quem queira proibir o conto nas escolas brasileiras porque "o negro não pode ser visto como eterno escravizado." Olhem, outra ironia.
«DN» de 27 Set 12

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