Os "graffitis"
Por Maria
Filomena Mónica
ACABO de chegar de
férias, um facto que me leva sempre a olhar Lisboa com uma atenção invulgar. É
então que noto ter nascido numa das mais belas cidades da Europa. Por viver no
centro histórico, sou, reconheço-o, uma privilegiada. É-me fácil esquecer a
outra Lisboa, a dos bairros periféricos, dos quarteirões de armazéns
abandonados e dos transportes públicos danificados.
Há tempos, apareceu no jornal Público um artigo, assinado por João
Teixeira Lopes e José Soeiro, em que se afirmava ser intolerável a punição dos
adolescentes que enchem a cidade de monstruosidades pintadas a spray
na base de que o poder político era incapaz de «descortinar os
significados que muitos jovens atribuem ao acto». Mais grave é a posição dos
desembargadores da Relação de Lisboa que consideraram que, ao encherem de graffitis algumas carruagens
estacionadas numa estação do Metropolitano de Lisboa, um bando de jovens não
estaria a cometer o crime de dano qualificado, uma vez que, inseridos nos
tempos e nas modas da juventude, os meninos estariam «a desenvolver uma forma
de arte e expressão». Pelos vistos, os srs. juízes concordam com a afirmação do
jovem muçulmano eL Seed no sentido de que os graffitis são «uma forma de deixarmos a nossa marca pelo mundo».
Claro que não é só em Lisboa que
existem graffitis. Por todo o mundo,
gangs tentam assim marcar o seu terreno. Referindo-me apenas a cidades que
visitei recentemente, bastou-me olhar os muros das docas de Barcelona ou, em
Florença, as casas que rodeiam a Praça de S. Marco, para verificar a expansão
do fenómeno. Curiosamente, não é em zonas burguesas que «os revoltados» gostam
de exercitar o seu talento, mas nos bairros pobres, onde mais facilmente se
podem esconder.
Há algumas semanas, fui de comboio a
Aveiro. Quando, no regresso, o Alfa parou em Braço de Prata – uma zona
miserável – a estação estava decorada com uma série de hieróglifos gigantes, ao
lado de um rosto com olhos arregalados, cabelos por pentear e a boca
semi-aberta. Ora, o espaço público é de todos e o privado tem donos que não
gostam de ver desfiguradas as fachadas das suas casas. Sei que este tipo de
jovens retira prazer de brincar ao gato e ao rato com a Polícia, mas isto não é
desculpa para que, se apanhados, as autoridades os não castiguem.
Em 1974, o chefe da Polícia de New York
analisou as carreiras de um grupo de graffiteiros
com 15 anos. Três anos depois, quase metade - 48% - havia sido presa por crimes
a sério. A pichagem constitui, como se vê, a iniciação numa carreira criminosa.
Os «artistas» que, à época, foram defendidos por Norman Mailer, são
delinquentes potenciais. É verdade que os próprios estão convencidos de que as
suas pinturas são formas legítimas de expressão, mas isto não significa que a
sociedade tenha de aceitar tal ideia. Se têm pretensões estéticas deverão ser
conduzidos para uma escola de artes, onde eventualmente aprenderão o que lhes
deve ser ensinado. Não basta sentir-se revoltado para se pintar como Paula
Rego.
«Expresso» de 13 Out 12
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NOTA (CMR): o gatafunho que em cima se vê foi escolhido para ilustrar esta crónica, por um motivo especial: é que, dada a ausência de espaço vago nas paredes e taipais de lojas aqui da rua, os artistas de serviço tiveram de 'baixar de nível'...
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