16.10.12

Os "graffitis"


Por Maria Filomena Mónica
 ACABO de chegar de férias, um facto que me leva sempre a olhar Lisboa com uma atenção invulgar. É então que noto ter nascido numa das mais belas cidades da Europa. Por viver no centro histórico, sou, reconheço-o, uma privilegiada. É-me fácil esquecer a outra Lisboa, a dos bairros periféricos, dos quarteirões de armazéns abandonados e dos transportes públicos danificados.
Há tempos, apareceu no jornal Público um artigo, assinado por João Teixeira Lopes e José Soeiro, em que se afirmava ser intolerável a punição dos adolescentes que enchem a cidade de monstruosidades pintadas a spray  na base de que o poder político era incapaz de «descortinar os significados que muitos jovens atribuem ao acto». Mais grave é a posição dos desembargadores da Relação de Lisboa que consideraram que, ao encherem de graffitis algumas carruagens estacionadas numa estação do Metropolitano de Lisboa, um bando de jovens não estaria a cometer o crime de dano qualificado, uma vez que, inseridos nos tempos e nas modas da juventude, os meninos estariam «a desenvolver uma forma de arte e expressão». Pelos vistos, os srs. juízes concordam com a afirmação do jovem muçulmano eL Seed no sentido de que os graffitis são «uma forma de deixarmos a nossa marca pelo mundo».
Claro que não é só em Lisboa que existem graffitis. Por todo o mundo, gangs tentam assim marcar o seu terreno. Referindo-me apenas a cidades que visitei recentemente, bastou-me olhar os muros das docas de Barcelona ou, em Florença, as casas que rodeiam a Praça de S. Marco, para verificar a expansão do fenómeno. Curiosamente, não é em zonas burguesas que «os revoltados» gostam de exercitar o seu talento, mas nos bairros pobres, onde mais facilmente se podem esconder.
Há algumas semanas, fui de comboio a Aveiro. Quando, no regresso, o Alfa parou em Braço de Prata – uma zona miserável – a estação estava decorada com uma série de hieróglifos gigantes, ao lado de um rosto com olhos arregalados, cabelos por pentear e a boca semi-aberta. Ora, o espaço público é de todos e o privado tem donos que não gostam de ver desfiguradas as fachadas das suas casas. Sei que este tipo de jovens retira prazer de brincar ao gato e ao rato com a Polícia, mas isto não é desculpa para que, se apanhados, as autoridades os não castiguem.
Em 1974, o chefe da Polícia de New York analisou as carreiras de um grupo de graffiteiros com 15 anos. Três anos depois, quase metade - 48% - havia sido presa por crimes a sério. A pichagem constitui, como se vê, a iniciação numa carreira criminosa. Os «artistas» que, à época, foram defendidos por Norman Mailer, são delinquentes potenciais. É verdade que os próprios estão convencidos de que as suas pinturas são formas legítimas de expressão, mas isto não significa que a sociedade tenha de aceitar tal ideia. Se têm pretensões estéticas deverão ser conduzidos para uma escola de artes, onde eventualmente aprenderão o que lhes deve ser ensinado. Não basta sentir-se revoltado para se pintar como Paula Rego.
 «Expresso» de 13 Out 12
-
NOTA (CMR): o gatafunho que em cima se vê foi escolhido para ilustrar esta crónica, por um motivo especial: é que, dada a ausência de espaço vago nas paredes e taipais de lojas aqui da rua, os artistas de serviço tiveram de 'baixar de nível'...

Etiquetas: