26.1.13

A Casa dos Degredos


Por Pedro Barroso
CUSTA-ME tanto este país em perda! E serei só eu?... 
Onde quer que o mau gosto invade a caravela do sonho, sinto tristeza. 
Onde quer que a festa se torne pimba e o castelo da beleza efémera em casa de altercação e analfabetismo. 
Onde quer que a cupidez ultrapasse o mérito, e o favor seja mais forte que o merecimento. 
Onde quer que se condecore uma besta e se ignore um mestre. 
Onde quer que se proteja a ignorância por dentro do saco podre do poder.
Onde quer que o estudo e a fabricação do belo, - retirado tantas vezes a escopro da nostalgia evidente do quotidiano - não nos forneça nem sustento, nem notoriedade e pelo contrario nos arranje inimigos, desconfiantes e críticos de esquina... 
Onde quer que isso aconteça, eu morro um pouco mais.
Será do país? Da gestão maior da cultura? Ou das pessoas mesmo? Serei assim tão exigente? Fico triste a cada dia, ao respirar este país coitado; tentando resistir pelos poros do fado, da praia e da montanha; talvez pela história, pela gastronomia e pela lenda; talvez ainda um pouco pela hombridade, tolerância e simpatia natural do povo. Sobram-nos os castelos bonitos, as águas de nascente, o fandango, o cante alentejano. As remessas de emigrante ajudam a combater a depressão dos que ficam, mas mesmo essa cada vez maior, que o desgaste é notório.
Como fazer? Não consigo viver entre tanto desvalor e desmerecimento e também não me apetece, não há paciência para ser triste a vida inteira!
Tentando resistir por essas pequenas bolsas de conforto ao signo malévolo, à fada maldita da ultima verdade, confirma-se há muito que a justiça não mora por aqui. Sinto-me triste e confrontado com a eficácia de tudo o que quis combater uma vida inteira. 
Vejam o próprio acordo ortográfico. Viver para a criatividade do belo, a sensibilidade e a inteligência compensam? Em Portugal, não. 
Vivi uma vida para isso, portanto - nada sou. Resta-me a consciência de mim e dos alguns que em mim têm referência. E de outros tantos resistentes, em bolsas avulsas de bom gosto e qualidade. Mas somos tão poucos Gonçalo Mendes da Maia... Alferes Duarte de Almeida, alguém se lembra? Somos ainda nada e ninguém, no oceano de tanta mediocridade. Qualquer treinador de futebol bate Eduardo Lourenço em prime time. Qualquer Casa dos Segredos bate o Pedro Barroso. Aliás, quem é esse Pedro Barroso, coitado? 
O país embrutecido e bovino amoucha. O país inteligente e digno revolta-se. Mas na guerra de audiências, por cá - digo eu, a quem nunca ninguém deu subsídios, e medalha de mérito, nem de limpezas de WC...- ganha sempre… a merda.
Tornámo-nos portanto uma fábrica de produto cultural avariado, com a validade condicionada ao dia vulgar da urbanidade medíocre e sem outro desejo de relevo que não seja a aurea mediocritas.
Neste caso já só medíocre, pois o ouro há muito que passou para o colo dos falcões.
E tudo o que fulge, afinal, é pechisbeque.

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1 Comments:

Blogger José Batista said...

Meu caro Pedro Barroso.

Como julgo compreendê-lo!

Olhe, um dia, em Guimarães, perante o entusiasmo de um acompanhante que lia num pedaço de muralha "Aqui nasceu Portugal" acrescentei sonoramente, num impulso: "E nasceu uma grande trampa"!

Mas o caro falava do que combateu uma vida inteira. E é aí que reside a coisa, julgo. É preciso combater a vida inteira, cada um no seu tempo, e muitos muitos, em muitas muitas gerações seguidas.

Congratulemo-nos com aquelas "pequenas bolsas de conforto ao signo malévolo". E resistamos, por elas e por nós.

Um dia atrás do outro. E sabe um segredo: há aqui e ali muita gente humilde e discreta que não troca o Pedro Barroso por qualquer coisa. Como sabe.

Não tome estes dizeres como qualquer lição que não pediu. Eles são apenas o pretexto para lhe deixar um abraço.
De agradecimento, por essa bela voz, as letras e as músicas.

Alma até Almeida e muito para além de Almeida.

26 de janeiro de 2013 às 15:40  

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