Os céus são bazófias comparados connosco
Por Ferreira Fernandes
COMO no álbum A Estrela Misteriosa, de Tintim, ontem um asteroide passou-nos
uma tangente e um meteoro caiu algures na Terra. Sem ousar abusar da
imaginação, Hergé juntou ambos: o meteoro era um fragmento do asteroide
que prosseguira viagem (no fundo, foi um único fenómeno). Mas, no
acontecido ontem, a realidade pôde permitir-se uma extraordinária
coincidência: de manhã, uma chuva de meteoritos espalhou-se pelos Urais
e, à noite, sem ter nada a ver com o fenómeno matinal, o asteroide 2012
DA14 cruzou-se connosco. Foi como se duas estrelas de Hollywood, Clooney
e Travolta, sem combinarem, se encontrassem por mero acaso num café em
Mogadouro.
O asteroide de ontem foi o que mais se aproximou da Terra sem
com ela chocar. E a chuva de meteoritos foi a que mais feridos causou,
mil. Antes dela, só consta um cão morto por um meteorito em 1911, no
Egito, e um miúdo ugandês ferido, em 1992.
Os céus, apesar de
ameaçadores, não passam disso. Já os fenómenos cá de baixo têm sido mais
eficazes. O álbum A Estrela Misteriosa foi publicado em 1942, na
Bélgica, e um seu quadradinho mostra um velho desesperado a bater num
gongue: "Vem aí o fim do mundo! Arrependei-vos!" No quadradinho
seguinte, o judeu Isaac diz ao judeu Salomão, esfregando as mãos: "Que
bom negócio, assim não vou ter de pagar aos fornecedores..." Nesse 1942,
em Auschwitz, os chuveiros de gás Zyklon B matavam mais do que até hoje
as chuvas de meteoritos.
«DN» de 16 Fev 13Etiquetas: autor convidado, F.F
2 Comments:
Ontem, às vinte horas, assistia eu ao telejornal das vinte horas no canal 1 da RTP. Muito didáctico, o apresentador, um escritor famoso que às vezes empisca o olho, tinha no final um especialista para comentar a acontecimento. Eufórico e enfático, o jornalista, apresentador, escritor, não se cansava de referir o asteroide que fez uma "razia" à Terra. E insistia na razia. E outra vez razia. Assim, tantas vezes, que até interrompia o especialista, o qual, por ser especialista, explicava calmamente e bem o fenómeno. E melhor o explicaria se não fosse interrompido tantas vezes, quase sempre com o conceito de razia.
Razia fez aquele sujeito na minha paciência, que cheguei a gritar um "irra!"
Será que já alguém lhe disse o que significa "razia"?
E o "dizimar", do género:
Fulano "dizimou" o braço do inimigo...?
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