Um problema enrolado e fino
Por Ferreira Fernandes
HÁ POVOS delicados. Por cá, queixamo-nos da falta de papel (que papel? O
papel: pilim), mas os venezuelanos exigem-no mais fino: "A revolução
trará para o país 50 milhões de rolos de papel higiénico para que o
nosso povo compreenda que não deve deixar-se manipular por campanhas
mediáticas dizendo que há escassez", disse esta semana o ministro do
Comércio venezuelano, Alejandro Fleming. Aparentemente a manipulação dos
venezuelanos gira sempre à volta de produtos ligados à celulose: ontem,
eram votos, mal contados, segundo a oposição; agora, o papel higiénico,
sujeito a boatos, segundo o Governo. Esta última questão lança uma
dúvida terrível sobre a inteligência dos venezuelanos: se a escassez é
um boato, como é que o povo não teve olho para notar que o produto,
afinal, havia? Aliás, é ingénuo acreditar em jornalistas que
propagandeiam a falta de papel higiénico quando eles próprios são
fornecedores de um produto concorrente. Em todo o caso, fica bem ao
Governo venezuelano, apesar de ciente de que tudo era campanha, insistir
em importar o papel higiénico (quase dois rolos por venezuelano).
Mais
uma vez o contraste connosco é notório: os nossos governantes fazem o
problema a montante, já os governantes bolivarianos ajudam a resolvê-lo a
jusante. E engana-se quem considera que esta questão nem devia ser
noticiada: tal como a liberdade, só nos damos conta da verdadeira
importância do papel higiénico quando não há.
«DN» de 19 Mai 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
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