28.1.14

«Dito & Feito»

Por José António Lima
Passos Coelho pode manifestar surpresa, mas não inocência, pela reacção de Marcelo Rebelo de Sousa ao desistir da corrida à Presidência de 2016. O palavreado sobre as presidenciais que Passos Coelho decidiu inserir na sua moção de estratégia, além de politicamente insólito e arrevesado, visava claramente uma figura - a de Marcelo.
Escrever que o candidato a apoiar pelo PSD não deve ser “um catavento de opiniões erráticas em função da mera mediatização gerada em torno do fenómeno político” só podia ter o propósito de dar uma alfinetada política em Marcelo e tentar condicioná-lo. O efeito foi tal e tão imediato que terá superado as expectativas do próprio Passos.
Sabe-se que o primeiro-ministro nunca morreu de amores por Marcelo e vice-versa - desde os tempos já remotos de Passos na JSD e da liderança de Marcelo no PSD, no final dos anos 90. Mas Passos, em nome dos interesses do PSD, não devia esquecer que Marcelo era, de longe, o candidato melhor colocado do centro-direita às próximas presidenciais. E, sobretudo, não pode vir agora afirmar, com ar de anjinho, que ficou “muito surpreendido” e que o perfil que provocatoriamente traçou na sua moção “não ofende ninguém nem exclui ninguém”. Poupe-nos a hipocrisia.
Quanto a Marcelo, deu o exemplo de Manuel Alegre em 2006 para dizer que não queria “dividir o eleitorado” do PSD e do centro-direita - e assim justificar a sua repentina e prematura saída de cena. Podia ter dado outro exemplo presidencial do PS, o de Jorge Sampaio, que lançou a sua candidatura em Fevereiro de 1994 e soube impô-la, com convicção, contra tudo e contra todos - contra a vontade da direcção do PS, do então líder António Guterres e do Presidente Mário Soares. E, como se sabe, Sampaio ganhou.
Um candidato presidencial não se desvia nem desiste do seu caminho por causa de vozes alheias ou por embirrações de dirigentes partidários. E, muito menos, por parágrafos em moções de estratégia.
Marcelo mostrou que, ao contrário do que se pensava, não queria mesmo ser candidato a Belém. E que só estava à espera de um pretexto para se afastar da corrida. Passos deu-lhe esse pretexto. Ou não foi bem assim?
«SOL» de 24 Jan 14

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