9.4.14

«Dito & Feito»

Por José António Lima
O que terá levado Durão Barroso a quebrar a regra, que há mais de nove anos impôs a si próprio, de não se pronunciar sobre questões da política interna portuguesa enquanto desempenhar as altas funções de presidente da Comissão Europeia? Barroso decidiu agora quebrar essa regra, com indiscutível impacto político e estrondo mediático - não poupou Sócrates por causa da bancarrota, Vítor Constâncio devido à falta de supervisão sobre o BPN, Manuela Ferreira Leite e Bagão Félix por subscreverem o manifesto da reestruturação da dívida... e até Passos Coelho por ultrapassar certos limites com a sua política de austeridade.
Duas razões terão movido Barroso a esta contundente incursão na política interna. Por um lado, no momento simbólico em que termina o programa da troika, Barroso não quer ser visto em Portugal como um dos maus da fita (“isso é a única coisa que me magoa”, confidencia) e até descreve como esteve “uma hora ao telefone a convencer a chanceler Merkel a dar mais tempo a Portugal e a uma redução dos juros”. Traduzindo, em termos de imagem: Barroso não fugiu do país em 2004, foi, sim, assumir a difícil função de liderar os destinos da Europa; e não foi o polícia mau da troika que impôs a austeridade aos portugueses, mas o polícia bom que ajudou a salvar o país da insolvência.
Por outro lado, depois de Marcelo Rebelo de Sousa se ter reposicionado na corrida presidencial em pleno Congresso do PSD e de Santana Lopes ter revelado há dias a sua disponibilidade para essa mesma corrida, Barroso terá sentido que corria o risco de deixar que outros ocupassem por completo o palco. E decidiu marcar o seu terreno.
Fê-lo com a proposta apressada e abstrusa de um Presidente apoiado por PSD, PS e CDS. Apetece dizer que - com tanto e tão alargado consenso - qualquer dia é melhor voltarmos aos tempos da União Nacional, reduzindo ao mínimo o pluralismo e impondo a unicidade do pensamento político.
Barroso precisava de puxar pelo tema e colocá-lo em cima da mesa. Fê-lo com uma ideia tonta, mas que o posiciona como potencial candidato do centro político. Bem pode repetir que não tem qualquer intenção de se candidatar a Belém. Esta entrevista é o seu melhor e maior desmentido.
«SOL» de 4 Abr 14

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