«Dito & Feito»
Por José António Lima
O que terá levado Durão Barroso a quebrar a regra, que há mais de nove
anos impôs a si próprio, de não se pronunciar sobre questões da política
interna portuguesa enquanto desempenhar as altas funções de presidente
da Comissão Europeia? Barroso decidiu agora quebrar essa regra, com
indiscutível impacto político e estrondo mediático - não poupou Sócrates
por causa da bancarrota, Vítor Constâncio devido à falta de supervisão
sobre o BPN, Manuela Ferreira Leite e Bagão Félix por subscreverem o
manifesto da reestruturação da dívida... e até Passos Coelho por
ultrapassar certos limites com a sua política de austeridade.
Duas
razões terão movido Barroso a esta contundente incursão na política
interna. Por um lado, no momento simbólico em que termina o programa da
troika, Barroso não quer ser visto em Portugal como um dos maus da fita
(“isso é a única coisa que me magoa”, confidencia) e até descreve como
esteve “uma hora ao telefone a convencer a chanceler Merkel a dar mais
tempo a Portugal e a uma redução dos juros”. Traduzindo, em termos de
imagem: Barroso não fugiu do país em 2004, foi, sim, assumir a difícil
função de liderar os destinos da Europa; e não foi o polícia mau da
troika que impôs a austeridade aos portugueses, mas o polícia bom que
ajudou a salvar o país da insolvência.
Por outro lado, depois de
Marcelo Rebelo de Sousa se ter reposicionado na corrida presidencial em
pleno Congresso do PSD e de Santana Lopes ter revelado há dias a sua
disponibilidade para essa mesma corrida, Barroso terá sentido que corria
o risco de deixar que outros ocupassem por completo o palco. E decidiu
marcar o seu terreno.
Fê-lo com a proposta apressada e abstrusa de
um Presidente apoiado por PSD, PS e CDS. Apetece dizer que - com tanto e
tão alargado consenso - qualquer dia é melhor voltarmos aos tempos da
União Nacional, reduzindo ao mínimo o pluralismo e impondo a unicidade
do pensamento político.
Barroso precisava de puxar pelo tema e
colocá-lo em cima da mesa. Fê-lo com uma ideia tonta, mas que o
posiciona como potencial candidato do centro político. Bem pode repetir
que não tem qualquer intenção de se candidatar a Belém. Esta entrevista é
o seu melhor e maior desmentido.
«SOL» de 4 Abr 14 Etiquetas: autor convidado, JAL
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