Ó Elvas, ó Elvas, Badajoz à vista
Por Antunes Ferreira
Embora já tenha abordado o assunto – ainda que pela rama,
numa resposta dada a uma comentadora – tenho de voltar-lhe, pois parece-me de
algum interesse. Trata-se de algo que me despertou para a realidade triste, mas
verdadeira. Por certo que já ouviram falar dele, mas por vezes as pessoas
retraem-se convencidas (por elas próprias ou por pressão de outras) e
escusam-se de denunciar o que se está a passar no domínio das finanças e da
economia entre os dois países ibéricos.
Por isso estou a pensar em mudar-me para Elvas e ali passar
a viver; para o Caia não porque é um local quase despovoado onde até uns anos
não havia sequer uma ATM. E se calhar ainda não há…. Além disso tem uma bomba
de gasolina que até mete dó e pode classificar-se como o lá vai um; e se calhar
nem esse um lá vai…. Quase como a A6 normalmente deserta, que se dizia ser
destinada a trazer espanhóis para Portugal e vice-versa. Um flop. Estou
decidido: escolho Elvas. De resto o Paco Bandeira já cantava Ó Elvas, ó Elvas,
Badajoz à vista, mas tenho de concluir que não nasci para contrabandista… E
que, por graça do cordo de Schengen já não há fronteiras.
Abrevio. Passei por Estremoz onde fica a casa dos meus
compadres Pereiras progenitores da minha filha/nora Margarida, ficámos, a
Raquel e eu mais eles na boa cavaqueira e depois seguimos para Badajoz.
Voltaríamos no dia seguinte pela tardinha, depois de nos alojarmos no Hotel
Lisboa, bastante degradado; mas o pessoal dele trata-nos nas palminhas.
Jantámos no centro da cidade, uma refeição carota, mas muito saborosa. Que
diferença sobre o tempo em que se ia lá para comprar caramelos. É preciso dizer
que enquanto Elvas tem 85 mil habitantes, Badajoz já alcançou os 150 mil.
Já não íamos a Badajoz há uns três ou quaro anos e agora
pudemos constatar que naquele restaurante dos oito empregados de mesa, seis
eram… lusitanos. À conversa com um deles ficámos a saber que vive em Elvas e
bastam quinze minutos para chegar ao trabalho - porque ali há trabalho. Os
outros camaradas eram de Rio Maior, Vila Boim, Barbacena e Santa Eulália. “Aqui
ganha-se mais do que em Portugal e se um homem não aprovêta está mesmo fodido,
desculpe minha Senhora.”
Já na quinta-feira fomos às compras, tendo corrido três hipermercados
e um centro comercial. Lá voltou o espanto: o salário mínimo em Espanha é €655
e em Portugal está nos €530; pois os preços são mais baixos do que no nosso
país. Por isso os portugueses que vão comprar coisas a Badajoz são quase metade
dos clientes. Não vale a pena compara-los (os preços) pois as diferenças são
evidentes. Reina o pague dois leve tês. À saída de um deles (não digo nomes
para evitar a publicidade grátis) a caixa tinha um dístico na blusa:
Maricarmén.
Quando nos ouviu falar imediatamente informou: “também sou
portuguesa e chamo-me Maria do Carmo; mas estes filhos da puta – desculpe-me
minha senhora rebaptizaram-me...” Em tom baixo disse-nos que era de Vila
Fernando onde o casal de filhos ficava durante o dia com a avó, pois o marido era
mecânico de automóveis no bairro de Valdepasillas, numa oficina de Seats. E
acrescentou quase num sussurro que ali ganhava-se muito melhor do que no nosso
país. Disfarçou, pois passava o gerente.
Fiquei a pensar em Olivença/Olivenza com os seus brasões
portuguesas e com os velhos a falar um portunhol ressabiado. “Temos que volver
a nuestra Pátria que não es Espanha, es Portugal”. Sendo ou não sendo são águas
passadas, porém aqui não há muitos portugueses. Não há hipermercados, nem
sequer supermercados. Por isso só um saudosismo espúrio leva até lá os turistas
lusitanos.
Antes de voltar ainda fui atestar o depósito do meu Hyundai
numa bomba pertencente a uma grande superfície. O litro é de €1,12; aí sim, com
o recibo das compras há um desconto e assim fica a €1,09; em Portugal é de
€1,44 e com desconto leva-nos €1,29. E embora se continue a dizer que “de
Espanha nem bom vento, nem bom casamento” mantenho-me na minha: penso que vou
mesmo morar em Elvas…
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