25.4.17

RENASCER ABRIL


Por A. M. Galopim de Carvalho
Renascer é uma constante na história dos homens. Vem de longe a ideia de renascer. Bennu, a ave da mitologia egípcia, ateava o fogo ao seu ninho e deixava-se consumir pelas chamas, renascendo depois, dos seus restos calcinados. Na Grécia antiga era Fénix que renascia das próprias cinzas. Há um paralelo entre esta ave mitológica e o Sol, que todos os dias morre no longínquo Poente, para renascer na manhã seguinte, do outro lado do mundo, numa alusão da morte e do renascimento da natureza. Na expressão figurativa do cristianismo, o renascer da Fénix tornou-se um símbolo popular da ressurreição de Cristo.
Renasceram cidades depois de destruídas por catástrofes naturais ou pelas guerras. Renascem para a vida as mulheres e os homens que se libertam dos agentes opressores. Renascem os cravos vermelhos, todos os anos, em Abril e, logo a seguir, nos campos, as espigas do trigo e as papoilas, ao mesmo tempo que, nas cidades, avenidas, praças e jardins das nossas cidades renasce um tapete de pétalas lilases de jacarandás.

Como nos aviões que, ao ganharem altitude, atravessam a espessa cobertura de nuvens e atingem o esplendor do céu e da luz, temos vindo a tenascer de uma escuridão em que, com excepção de uns tantos privilegiados, fomos levados a mergulhar.

É este renascer de Abril que hoje festejamos, expresso num recuperar da esperança que nos fora roubada por um molho de rapazes espertos, a quem, ingenuamente, levados pela mentira, entregámos o nosso destino, num tempo de pesadelo que durou quatro longos anos, durante o qual
assistimos à asfixia e destruição de muitas das nossas valências económicas, ao empobrecimento de um número cada vez maior de famílias, ao desumano abandono dos idosos, a par de escândalos de corrupção descarada e impune (e aqui, infelizmente, nada mudou) e do aumento do número e da riqueza dos ricos. Assistimos ao afundamento da classe média, ao drama do desemprego, particularmente doloroso para os que já não conseguem encontrar um posto de trabalho, e à triste emigração de uma juventude que a democratização do ensino qualificou a níveis nunca antes conseguidos. Tudo isto numa caminhada de submissão a uma União Europeia (cada vez mais afastada dos princípios que a fundaram) conduzida sem qualquer sensibilidade social, e sob a conivência do então e tristemente célebre, mais alto magistrado da Nação.
Durante a campanha eleitoral para as legislativas de 2015, defendi, nesta minha página, com sincera e lúcida convicção, a necessidade de entendimento entre o PS e os partidos à sua esquerda, como única via para afastar do poder uma coligação que, fortemente apoiada pelos grandes interesses do mundo das finanças cá de dentro e lá de fora das nossas fronteiras e por uma poderosa comunicação social ao seu serviço, nos estava deliberadamente a empobrecer, não só materialmente, como no que nos restava de esperança e de dignidade.
Para satisfação da maioria dos portugueses, aconteceu que a 26 de Novembro de 2015, os seus legítimos representantes no Parlamento puseram fim ao dito pesadelo. Nasceu então chamada “geringonça”, termo criado com propósito pejorativo, mas que o tempo, mercê de uma governação ponderada e sensata, inteligentemente amparada pelo actual Presidente da República (em quem não votei, mas que se me tornou uma revelação que hoje apoio e muito admiro), tem vindo a transformar-se num símbolo de esperança a renascer na maioria dos portugueses. António Costa e os partidos à sua esquerda sabem bem que a direita não perdoa e que, ajudada pela forças que bem conhecem cá dentro e lá fora, vão continuar a fazer o possível e o impossível para minar os entendimentos entre eles conseguidos.
Usada pelas forças apeadas do poder, no propósito declarado de achincalhar a solução de um PS a governar com o apoio parlamentar do BE, do PCP e do PEV, a palavra geringonça vingou e desmentiu os maus presságios que uns, hábil e interesseiramente, e outros, convicta e alienadamente, anunciaram. “Geringonça” é hoje um nome popular e, até, carinhoso.
É este renascer de Abril, a par do que nasceu há 43 anos, que hoje celebramos.

NOTA:
A palavra “geringonça” aparece no “Diccionário da Lingua Portugueza”, do grande lexicólogo António de Morais (1755-1824), definida, entre outras, como: “coisa mal engendrada que ameaça ruina; obra mal feita e armada no ar”. Copiando-o de certa maneira, como é regra neste tipo de obras, o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, disponível na net, considera-a sinónima de “caranguejola” e, também entre outras, define-a como: “coisa mal feita, obra armada no ar”. Embora por forma ligeiramente diferente, o Dicionário Online de Português diz: “coisa malfeita, que ameaça ruína; obra maljeitosa e mal armada que ameaça desconjuntar-se”

As novas edições destes dicionários vão ter, necessariamente, de acrescentar o actual significado desta palavra.

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4 Comments:

Blogger opjj said...

Lamento muito, mas acho que já tem idade de ser mais realista e mais senso. Pois, tem dependência de prebendas.O Costa chegou e com uma varinha mágica transformou tudo! Só que Costa era 2º quando em 2010 nos levou à falência.Tudo o que foi vendido e tirado foi pela sua assinatura.Pois a idade a alguns tira a memória. Falta-lhe reverter os enormes impostos do GASPAR.
Só com o aumento do gasóleo perdi o triplo do CES revertido que recebo.
Diga-nos quais os países não capitalistas onde se vive melhor?
A criação tem de ser livre, por isso, dou valor à inteligência.

25 de abril de 2017 às 20:24  
Blogger José Batista said...

Em minha opinião, o Professor Galopim pensa e sente como a maioria do povo português, que compreende bem e respeita profundamente. Somos muitos os que "respiram" aliviados. Nem tudo está bem, mas antes assim que pior.
O Governo e o Presidente estão de parabéns.
E nós também.

26 de abril de 2017 às 16:40  
Blogger Carlos Esperança said...

Perante o salazarismo jurássico que resiste, não posso deixar de expressar ao Prof. Galopim de Carvalho a minha admiração, estima e solidariedade. Aqui fica a minha homenagem ao cidadão e cientista.

27 de abril de 2017 às 09:10  
Blogger opjj said...

Este Carlos Esperança percebe é de salazarismo jurássico. Gente que sempre viveu à custa do Estado e nem sequer sabem o que dar no duro. Para que possa dar umas bocas ressabiadas, a mim e a outros o deve. Eu senti na pele e na carne. Não sou é faccioso e conheci alguns patrões para poder viver.Aprecio a verdadeira liberdade sem donos.

29 de abril de 2017 às 19:12  

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