8.6.17

António Gentil Martins e Paulo Rangel

Por C. Barroco Esperança
António Gentil Martins, um destacado cirurgião pediátrico, bastonário da OM, durante quase uma década, e figura de relevo na sociedade portuguesa, foi durante toda a vida um ultraconservador que me habituei a respeitar.
 Discordava das suas posições cívicas e políticas porque defendia posições retrógradas, e respeitava-o. Opunha-se à descriminalização do aborto e à eutanásia com intransigente radicalismo, mas exercia o seu direito, tão legítimo como o meu, de sinal contrário.
 Até ao dia
 até ao dia em que lamentou que a evolução da ecografia levasse à IVG, o que impedia o termo de gravidezes com malformações fetais, nomeadamente de bebés siameses, e impedia o adestramento de cirurgiões para tais cirurgias. O médico que fez cerca de 12 mil cirurgias, salvou imensas vidas e, em sete pares de gémeos siameses que separou, conseguiu a sobrevivência de nove, perdeu, na sua aversão à IVG nos casos de risco de vida da mãe, malformações fetais e violação, a consideração que me mereceu.
 Hoje, a fazer 87 anos, só lhe desejo saúde e vida. Perdeu o meu respeito e consideração.
 ***
 Na última sexta-feira, Paulo Rangel, eurodeputado do PSD, no debate "Decidir sobre o final da vida", promovido pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV), onde se confrontaram posições a favor e contra a eutanásia, manifestou-se, com toda a legitimidade, contra a legalização.
 Se há temas que dividem não apenas as pessoas, mas a própria pessoa, este é um deles. Podendo alegar-se que os direitos individuais não se impõem aos outros e são sempre lícitos, não há outros motivos consensuais. Paulo Rangel tem uma posição defensável e legítima.
 Onde tocou as raias do absurdo e se portou de forma demencial foi no argumento usado: «Se existe o direito ao suicídio também existe ao homicídio». É possível que um jurista experiente não distinga as situações, as equipare e, em coerência, exija a mesma sanção penal para o assassínio e o suicídio, ambos na forma tentada, já que o suicídio bem-sucedido não é passível de julgamento?
 Tal dislate parece-me tão reles como pensar que o assassinato de uma pessoa normal é homicídio e o de uma criatura como Rangel, um “crime de maus tratos a animais”.
 Decididamente, convivo mal com talibãs.
 Ponte Europa / Sorumbático

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