13.10.17

A BURRA DO BURRO DAS BERLENGAS

Por Joaquim Letria
Sou o único jornalista do mundo a ter entrevistado o rei das Berlengas, incarnado pelo meu amigo Mário Viegas no filme escrito, realizado e inventado pelo meu querido Artur Semedo. Numa tentativa de arrumações, topei hoje com uma velha “cassette” BetaCam em que esse filme -- onde eu desempenhava o papel dum intrépido e jovem repórter do Canal 6 da Zona Centro -- foi distribuído pelos clubes de vídeo que Deus tem.
A evolução tecnológica impede-me de momento de rever o filme, pois agora só tenho computadores e leitores de CDroms. Mas o interessante foi ter recordado algumas divertidas peripécias da rodagem desse filme, enquanto relia a capa ilustrada do VHS, e o meu espírito se ter fixado na memória dum episódio histórico que não tem nada a ver com aquilo que tinha em mãos.
Fiquei a pensar – a ponto de vo-la narrar agora –na história da burra do faroleiro das Berlengas que chegou a constituir um quebra-cabeças para as nossas gloriosas Forças Armadas, fundadoras da Aliança Atlântica, intervenientes na Bósnia Herzegovina, Kosovo, Mediterrâneo, Mar Egeu, Afeganistão, Mali, Líbano, Norte de Itália e Sul de Espanha.
Contou-me o saudoso almirante Souto Cruz, que fez o favor de ser meu amigo, com o humor contido, elegante e inteligente que o caracterizava ,aquele que terá sido o mais embaraçoso momento para ele, enquanto Chefe do Estado Maior da Armada, ele que viria a tornar-se Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, superintendendo ao Comando Conjunto dos Três Ramos e que temíveis assembleias da NATO enfrentara.
Aconteceu que à vasta secretária que o almirante ocupava no espaçoso gabinete da Avenida das Naus, no então Ministério da Marinha, chegara, acompanhada pelo devido despacho, uma petição do faroleiro das Berlengas e Farilhões solicitando que o respectivo comando procedesse à aquisição duma burra que fizesse companhia ao asno que assegurava o transporte do homem e víveres (com a mulher, em isolamento pelo período dum ano) e que a par de desbastar a erva com que se alimentava, em redor da casa e do farol, garantia as ligações através das escarpas e alcantarilhas que separavam o farol do embarcadouro. Bom de ver que se tratava dum burro estratégico…
A Marinha, que ainda hoje superintende a esse território da orla marítima, não pensara que um burro não é de pau…e vai daí, o pobre quadrúpede era frequentemente assaltado pelo desejo carnal e não havia brida, cabeção, rédea ou arreata que o contivesse e o faroleiro via-se grego para o apanhar nas suas fugas galopantes, desesperadas e solitárias, a zurrar pelas escarpas.
— Agora imagine você se eu despachasse “compre-se uma burra para o burro do faroleiro das Berlengas”— contava-me a rir Souto Cruz que, diplomata como era, lá arranjou maneira de satisfazer os apetites do burro sem se comprometer para sempre com um despacho ridículo. Embora este seja um assunto da mais alta esfera da Defesa Nacional, muito gostaria eu de saber o que fazem hoje os almirantes e como vai hoje a vida sexual do burro das Berlengas. É mais importante do que parece! Perguntem ao faroleiro…

Publicado no Minho Digital

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1 Comments:

Blogger 500 said...

Boa! E como é que o almirante resolveu a (ridícula) questão?

13 de outubro de 2017 às 23:07  

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