POVO HUMILHADO E SEM PÁTRIA
Por Joaquim Letria
O drama do povo curdo não merece ser esquecido. Conveniente aos interesses das potências coloniais ou do mais amplo e recente dos imperialismos, os curdos ficaram sem Pátria e separados por fronteiras desenhadas por guerras, conflitos, jogos de salão e de outras hipocrisias que prevalecem até hoje.
Subjugados,
os curdos mantiveram a sua língua e a sua cultura próprias, quase
clandestinamente, nas cinco nações por onde se encontram espalhados e onde
sempre que interessa às grandes potências são activados como importante
elemento político, acabando por servir de bode expiatório e sem que
ninguém cumpra as promessas, sempre renovadas, de terem uma Pátria.
Aquilo a que
propriamente se pode chamar Nação Curda alastra, de forma transfronteiriça, por
cinco Estados onde sempre são considerados uma nódoa que ninguém consegue
limpar: Irão, Iraque, Turquia, Azerbeijão e Quirziguistão, estes dois últimos
Estados parte da falecida União Soviética.
Em 1977 conheci
a realidade do povo curdo e a sua luta e pude acompanhar, nas montanhas do
norte do Iraque, as incursões das forças do leader guerrilheiro Barzani que,
subvencionado pelos americanos, desestabilizava o regime de Sadam Hussein que
na altura ainda estava de bem com o Ocidente por ser um grande cliente das
exportações britânicas, francesas e americanas, cujas companhias empanturrava
de petróleo.
Pude então
acompanhar a preparação que os curdos recebiam de conselheiros militares
ocidentais para militarmente incomodarem os soviéticos, em cujo território eram
melhor tratados ainda que sob a insensibilidade que os regimes autoritários
dedicam às suas minorias étnicas.
Era na antiga
Pérsia do Xá Rezza Palhevi que os curdos sofriam os piores crimes, assassinados
sem regras nem critérios pelo simples facto de procurarem falar e ensinar a
língua e história pátria às suas crianças, as quais educavam nos seus costumes
e tradições.
Até hoje os
curdos continuam a ser os peões das nicas das potências regionais e mundiais. O
seu partido e o seu braço armado PKK combateram o terrorismo no Iraque e agora
na Síria, sempre desempenhando a parte mais difícil das operações militares e
obtendo os melhores resultados das forças terrestres.
Compreendo o
desespero dos curdos, que se espalha por toda a diáspora onde a sua coragem e
cultura continuam a criar novos mártires. A memória traz-me rostos, nomes e
sorrisos de mulheres e homens que acompanhei nas montanhas, cheios de esperança
e roídos de sofrimento. Curvo-me com respeito perante o povo curdo, povo
humilhado e sem um território para construir aquilo que lhes roubaram e de que
não abdica: uma Pátria.
Publicado no Minho Digital
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