16.3.21

No "Correio de Lagos" de Fev 21

QUANDO, em tempos já pré-históricos, entrei para o IST, ansiava por conhecer ao vivo um tal Prof. Ilharco, personagem lendária de quem já muito ouvira falar e que, entre outras bizarrias, era capaz de escrever com giz preto no quadro preto! Vim, de facto, a tê-lo como professor de Química e, por sinal, aprendi muito com ele, nunca esquecendo, p. ex., que “Por muito bem que as coisas se façam, é sempre possível fazer melhor”.
Cumprimentando-nos afavelmente, e um por um, à entrada do anfiteatro (onde, apoiado num enorme ponteiro, nos esperava envergando a sua sempre imaculada bata branca), o Prof. Ilharco era personagem de muitas rábulas, com destaque para as suas “perguntas à inteligência”, a mais célebre das quais era “Porque é que um tripé tem três pés?” — que tinha como resposta “Se tivesse menos caía, e se tivesse mais era desperdício”. E essa “pergunta de algibeira” era tão conhecida, que eu já a ouvira no liceu, quando aprendi “Os três pilares do Estado”: os poderes Legislativo, Executivo e Judicial, pretendendo-se dizer com isso que uma sociedade pode colapsar se algum desses “pés” falhar — um risco que sempre associo à profusão de leis-da-treta que não passam de letra-morta por mais estratosféricas que sejam as penalidades que o nosso legislador invente. Ora, e se já é grave termos, quanto a isso, problemas de sobra no dia-a-dia, imagine-se o que pode suceder numa situação como a actual, em que a crise sanitária nos leva aos limites da resistência. E é por isso que não percebo como é possível que, em plena pandemia, ainda haja tantas pessoas que desrespeitem as mais elementares normas de cidadania e de segurança sem que NADA lhes aconteça.
Aliás, o primeiro Estado de Emergência foi decretado há 11 meses, mas só em Junho foram anunciadas penalidades para quem violasse as respectivas normas. Pois, mesmo assim, e quando já havia gente a morrer, ainda as autoridades se entretinham a fazer “pedagogia” em vez de actuarem com a firmeza que a situação impunha. Mais tarde, em Outubro, estabeleceram-se coimas de 100 a 500 euros para quem não usasse máscara em locais públicos. E o que sucedeu quando, no mês passado, se constatou que muita gente nem isso cumpria, apesar de os números de infectados e mortos atingirem os valores mais altos do mundo? Simples: o valor das coimas foi multiplicado por dois, fazendo lembrar o comerciante que dizia: “Este ano não ganhei nada, mas no próximo vou ganhar o dobro!”.
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ENTRETANTO, e de um momento para o outro, os NEGACIONISTAS cederam o palco aos OPORTUNISTAS, com a histeria do “não quero ser vacinado!” a dar lugar à dos que querem sê-lo, mesmo fraudulentamente — quando se soube que cerca de 1000 políticos (incluindo os saudáveis e substituíveis) eram considerados prioritários! Claro que o legislador, sempre incapaz de se antecipar ao óbvio, já veio a correr atirar para cima de nós mais umas quantas penalidades terríveis, que hão-de ter tão bons resultados como os que vimos em relação à malfadada festa de Odiáxere que, com os seus 119 infectados em 12 dias, teve a ‘honra’ de despertar a atenção da Sra. Ministra da Justiça, que participou o caso ao M.P., exigindo que o Estado fosse indemnizado.
A TERMINAR, volto um pouco atrás, pois não resisto a contar o que se passou quando o Capitão Cook quis que os seus homens comessem limões como “vacina” contra o escorbuto: sendo bom conhecedor da natureza humana, foi dizendo que os citrinos eram apenas para consumo dos oficiais. Face a isso, a tripulação, que já se preparava para os REJEITAR, revoltou-se, EXIGIU-OS... e “venceu”! — pelo que podemos imaginar o bom do capitão, refastelado no seu camarote, comemorando, entre uns goles de rum e umas boas gargalhadas, a sua vitória sobre esses que, no séc. XVIII, foram os precursores dos nossos “negacionistas de trazer por casa”.
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No "Correio de Lagos" de Fev 21

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2 Comments:

Blogger José Batista said...

Saboroso e pertinente texto. Parabéns. Abraço.
JB

16 de março de 2021 às 15:30  
Blogger SLGS said...

O Capitão CooK, homem inteligente e profundamente conhecedor da natureza humana, soube dar a volta aos negacionistas.
Actualmente, os nosso políticos incoerentes e com muita informação contraditória (é só para menores de 65...agora já serve até para maiores de 80...provoca efeitos trombóticos...já não provoca, ou se provocar são residuais e para além disto tudo o resto, em duas semanas passámos dos piores para os melhores do mundo...)muito dificilmente conseguirão dar a volta aos negacionistas. Não são conhecedores da natureza humana...nem inteligentes.

16 de março de 2021 às 18:50  

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