1.7.22

POLIGLOTAS

Por Joaquim Letria

Os espanhóis patrioticamente falam mal qualquer língua. Nós, pelo contrário, falamos menos mal qualquer idioma.

Somos uns poliglotas. Para além de falarmos com os estrangeiros, dizemos palavras que passámos a usar entre nós para nos dar estatuto e importância. Deixámos de andar ou de correr e passámos a fazer footing ou jogging, abandonámos a prancha e a vela para praticarmos sailing ou windsurfing, reunimo-nos em meetings, discutimos os problemas em brainstorming, trocámos os exames, os pontos e chamadas para nos dedicarmos aos tests e deixámos de usar pranchas de andar ao sabor das ondas para praticarmos planning.

Nas empresas deixámos de despedir gente ou de reduzir despesas para nos entregarmos ao downsizing, recorremos a colaboradores externos fazendo o outsourcing e as referências de níveis passaram a ser super-in e benchmarking.

Aquilo que eu gostava de fazer em Los Roques, Venezuela, ou em Cayo Largo, Cuba, que era pôr uns óculos de mergulho e um tubo respirador para, durante horas, dar devagar às barbatanas a ver os peixinhos coloridos por baixo de mim, passou a ser uma nobre actividade que dá pelo pomposo nome de snorkling.

Snorkling não é para qualquer um. Ainda antes de estarmos fechados em casa ou a morrermos como tordos com a gaita do coronavírus encontrei, numa recepção, uma bronzeadíssima amiga minha a quem perguntei a que se devia aquele bronze invejável, julgando que regressara do Rio ou da neve espanhola e ela disse-me que estivera com o personal trainer dela a fazer snorkling no Mar Vermelho.

Eu ignorava as virtudes do Mar Vermelho para o snorkling, mas a minha amiga jurou-me que o Mar Vermelho para o snorkling é superalucinante. Agarrei num copo de vodka com sumo de laranja, que crismámos de screwdriver, e fui à vida, a pensar no Mar Vermelho. Quero eu  dizer  fui worlding.

Logo encontrei outra conhecida minha, muito simpática aliás, que é copy numa agência de publicidade que me confessou que odiava o snorkling mas adorava o diving, que praticava nos Açores e no Mar Vermelho. Fiquei intrigadíssimo. Tomara dois banhos no Mar Vermelho em toda a minha vida e só achei que a temperatura era boa.

Este awfull CORONA VIRUS está a fazer diminuir as minhas actividades de counselling, teaching e writing. A verdade é que falamos línguas à brava e de nada serviu os meus queridos directores do Diário de Lisboa me gritarem que “assassinato era um galicismo, na nossa língua escreve-se assassínio!”.

Coitados deles se cá estivessem a ler os nossos jornais e a ver e ouvir as nossas rádio e TV…Tinham um stroke

Publicado no Minho Digital

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