FALANDO DE PRAIAS
Por A. M. Galopim de Carvalho
Nesta altura do ano em que muitos procuram as praias, lembremos alguns aspectos que a geografia e a geologia nos ensinam sobre este domínio. Mas, antes de definirmos praia, abordemos o conceito de litoral, começando por lembrar que Luís de camões, no canto III de “Os Lusíadas”, o definiu no verso “... onde a terra se acaba e o mar começa...”
Para geólogos, geógrafos e biólogos o litoral compreende:
(1) a faixa emersa da linha de costa limitada superiormente (do lado de terra), via de regra, por um acidente fisiográfico (uma arriba, uma rotura de declive) ou pela ocupação permanente de vegetação não tolerante ao sal;
(2) a faixa imersa, limitada inferiormente por uma linha abaixo da qual o fundo marinho não é significativamente perturbado pela ondulação habitual na região. Na nossa costa ocidental, este limite inferior ronda a profundidade de 10 m, sendo de 6 m, em média, na costa sul algarvia.
Para falar de praias, além:
(1) da natureza dos materiais que as integram, como areias, calhaus e bioclastos (habitualmente as conchas inteiras ou fragmentadas de bivalves e outros restos esqueléticos);
(2) da geologia das terras em confronto; e
(3) do clima local (não esqueçamos que o clima condiciona a evolução geomorfológica em qualquer lugar da terra),
temos de falar da ondulação, que não é mais do que a agitação da camada superficial das águas de uma determinada área do mar (área de geração) soprada pelo vento. A ondulação transporta quase toda essa energia, sob a forma de ondas ou vagas, a caminho dos litorais, consumindo-a, aí, quer na rebentação, quer nas correntes litorais a que dá origem.
Ao aproximar-se de terra, e à medida que a profundidade se reduz, a crista da onda torna-se, progressivamente, assimétrica, tombando para a frente até rebentar.
Um parêntese para dizer que alguns autores não fazem distinção entre onda e vaga. Outros consideram a vaga como a onda deformada, em vias de rebentação, aspecto que todos presenciamos na praia, e para dizer que a agitação do mar, que atinge o nosso litoral oeste, é gerada no Atlântico norte, e que chega aqui com uma direcção de propagação NW-SE, na maior parte do ano.
Para falar de praias temos ainda de lembrar que as marés, uma consequência directa das interacções gravíticas entre a Terra e os corpos celestes que lhe estão próximos (em particular o Sol e a Lua), representam uma outra importante fonte de energia fornecida às águas do mar. No seu constante e ritmado movimento ascendente e descendente, avançando e recuando face ao litoral, penetrando nas reentrâncias da linha de costa, para delas sair e tornar a entrar, num vaivém interminável, as marés são geradoras de correntes susceptíveis de exercer erosão, transporte e redeposição de sedimentos, quer junto ao litoral, onde são mais visíveis e conhecidas por correntes de maré, quer na plataforma continental, nomeadamente no seu bordo distal, na transição com a vertente continental.
Para além destas correntes, há outras, menos importantes que não cabe aqui aprofundar, como as relacionadas com a rotação da Terra, as diferenças de temperatura e as diferenças de salinidade das águas.
O vento, a ondulação, dele resultante e as correntes litorais a que dão origem, por um lado, e as marés e respectivas correntes, por outro, são os principais agentes forçadores da dinâmica actuante nas praias e também nos litorais rochosos (um tema a tratar mais tarde).
As características físicas da ondulação (altura, comprimento da onda, período, frequência, etc.) reflectem a energia disponível e dependem da intensidade do vento, da duração da sua incidência e da distância de colecta, isto é, a extensão, em comprimento, da região do mar soprada pelo vento. Com poucas perdas durante a propagação, as vagas atingem os litorais, exercendo aí, sobretudo, erosão e transporte. Nos fundos arenosos não consolidados, situados a profundidades susceptíveis de sofrerem as acções das vagas, estas remobilizam uma parte mais superficial da cobertura móvel (em geral areias siliciclásticas ou bioclásticas), promovendo sedimentação (ou ressedimentação) muito particular, reconhecida pelas marcas de ondulação (as ôndulas ou “ripples” dos autores de língua inglesa) que lhe são próprias.
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