Para que servem os professores? – perguntou, no Prós e Contras, com trejeitos de animadora mediática, para gáudio e aplauso da plateia acéfala, Clara Pinto Correia, professora e investigadora (?), colunista e colunável que se tornou há bem pouco tempo notícia escandalosa em jornais e revistas por ter plagiado uns artigos. Se foram esses os métodos ensinados pelos seus professores ou se os ensina aos seus alunos, não me espanta que questione a sua utilidade como professora, pois lhe bastará mandar os estudantes à Internet para fazer “copy & paste” de um qualquer artigo! Mas a memória é curta... e este país parece sofrer de amnésia crónica.
E eu, professora do Ensino Secundário, por vocação e escolha, me confesso: ao fim de 35 anos de dedicação exclusiva ao ensino, senti-me esventrada até ao âmago da alma pela agudeza da pergunta e tentei encontrar uma (possível) resposta que gostaria de partilhar com o mundo. Para que servem, então, os professores?
Servimos, em primeiro lugar, como bombo da festa e consolo nacional para a ignorância, mediocridade e incompetência que grassa transversal e perpendicularmente em todas as profissões (sem excepção!) deste país; presumo, a julgar pela atitude da plateia, que não tivemos, nem temos, qualquer crédito na formação dos bons, dos competentes e dos cultos. Se os portugueses estão na cauda da Europa, não é por falta de habilitações, nem por trabalharem mal, mas por terem tido maus professores!
Servimos de desculpa e bode expiatório para a impossibilidade, incapacidade ou desinteresse dos pais (quantos destes naquela plateia?), encarregados de educação e outros familiares em ensinarem aos filhos, nos primeiros anos da infância, os princípios morais e cívicos, tão necessários à formação do indivíduo. Como poderá a escola impor hábitos de higiene, de delicadeza, de disciplina e outros igualmente básicos a alunos adolescentes, quando os não tiveram na infância? Servimos, assim, para assediar os pais com chamadas à escola, incomodando-os com ninharias como as faltas injustificadas, mau comportamento ou o desinteresse dos filhos.
Servimos também para arcar com as culpas e responsabilidades do falhanço continuado de reformas impostas por sucessivos Ministérios, feitas muitas vezes “sobre o joelho” e por gente que desconhece a realidade escolar e aposta no facilitismo para mascarar o insucesso.
Servimos de trampolim para muitos “chicos-espertos” fazerem carreira à custa do nosso trabalho e da nossa dedicação, apesar das condições miseráveis das nossas escolas.
Servimos para muita coisa, pelos vistos, menos para ensinar as matérias das nossas disciplinas, porque passamos o tempo a tentar que os adolescentes se comportem com civismo, sentados (sim, C. P. Correia, um acto tão simples como ficarem sentados 45 m) a uma mesa, a trabalhar numa aula de Português ou de Matemática, sem gritos, sem conversa, sem música de telemóveis, para só falar nos males menores.
Servimos de pano para toda a obra, nas nossas escolas, mas servimos, acima de tudo, para amar os nossos alunos, para os compensar das muitas carências afectivas, mesmo quando nos rejeitam, para tentar ensinar-lhes, embora remando contra a maré de bruteza desta sociedade que os tritura, que há valores que são eternos, como os diamantes e, como eles, igualmente preciosos.
Deana Barroqueiro Escritora e Professora do E. Secundário
Deana, concordo consigo em quase tudo, excepto na sua visão parcial do problema. Também há professores que não se interessam minimamente pelos seus aluno e pelo ENSINO em geral. Já agora quantas vezes é que foi avaliada durante a sua carreira? E como é que essas avaliações funcionam? Não deixo de concordar que os principais educadores são o meio familiar mas criticar esse ponto é muito perigoso, principalmente para a classe política. Não me posso queixar dos professores que tive, alguns melhores, outros piores, mas acho que ter estudado numa escola semi-pública ajudou. Já agora posso deixar mote para o resto do post, porquê esta diferença entre o público e o privado? Será uma questão de dinheiro, ou uma questão de fiscalização, será uma questão de condições, ou os alunos que frequentam estas escolas apresentam outro nível de educação e voltamos ao problema "família" para explicar o problema Português? B.
B., e não pretendi dizer que todos os professores são bons, há bons e maus, como em todas as profissões, o que me revolta é o modo como se generaliza em relação aos professores, parece que se tornou moda responsabilizar-nos pelo insucesso e abandono escolar, quando toda a sociedade é responsável por isso. Há muita gente que se torna professor, por não ter emprego nas suas próprias profissões ou para fazer uns biscates, enquanto não aparece coisa melhor. Quanto a mim, fui avaliada várias vezes, primeiro com um estágio de 2 anos, a dar simultaneamente aulas a 4 ou 5 turmas, com avaliação constante de 2 professores do E. Secundário e de 1 Universitário. Para cada mudança de escalão (estou no último), fiz várias acções de formação (sérias e ligadas às minhas disciplinas Port/Fr), com trabalhos escritos, para além dos relatórios e de outras avaliações por equipas do Ministério, portanto exteriores à escola, onde se pode ver como dava aulas e fazia desenvolver o trabalho dos meus alunos (existem 4 obras publicadas com os trabalhos de alunos de várias turmas, num período de 5 anos). Fiz dois anos de um Mestrado e escrevi uma tese que, todavia, não quis defender, por não me interessar o canudo ou a universidade, mas porque acredito na formação contínua de qualquer profissional (e que é descurada no nosso país) mas entreguei a tese e 2 dossiers de materiais no Ministério, se deles se quisessem servir. Mas também, ao longo dos meus 35 anos de professora, fiz dezenas de projectos que me ocuparam outras tantas horas, além das tais 22 que tinha de dar, sem nunca ter recebido o pagamento de uma hora extraordinária – ocupando os tempos livres de dezenas de alunos com grupos de teatro e encenando peças (10), fazendo exposições, escrita criativa, cursos de culinária e tantas outras coisas, caro (a) B., que nunca foram avaliadas, nem tomadas em conta pelo Ministério de Educação e as minhas notas, como as de milhares de professores como eu, foram sempre de Satisfaz, exactamente iguais aos do turistas e biscateiros do Ensino. E não me arrependo, pelo contrário, fá-lo-ia de novo, se já não estivesse velha de 60 anos e semi-cega. E, sabe uma coisa, B.? Se o ensino oficial fosse pago e caro como o particular, talvez não se ouvisse dizer aos meninos nos programas de TV, que no colégio têm de trabalhar para as explicações, “porque os pais pagam um balúrdio e os obrigam a estudar”, mas que na escola é outra coisa.
Cumprimento Deana Barroqueiro pelo seu texto "Para que servem os professores?" e pela resposta dada a B. que subscrevo, na íntegra. Pretende-se atribuir aos professores todas as responsabilidades pela situação caótica do ensino e da educação. Os professores são o bode expiatório daqueles que querem alijar as suas responsabilidades. Pais, sociedade civil, em geral, e políticos demitem-se das suas funções e remetem à Escola a tarefa que a todos diz respeito.
Quando me confronto com algumas opiniões de pessoas que, teoricamente, deviam analisar racionalmente as situações, tenho pena que não possam enfrentar, no seu dia a dia, 1, 2, 3 ou 4 turmas de crianças ou de adolescentes. De certeza que mudariam a sua opinião em três tempos e muitas desistiriam ou teriam de recorrer a psiquiatras.
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Para que servem os professores?
Para que servem os professores? – perguntou, no Prós e Contras, com trejeitos de animadora mediática, para gáudio e aplauso da plateia acéfala, Clara Pinto Correia, professora e investigadora (?), colunista e colunável que se tornou há bem pouco tempo notícia escandalosa em jornais e revistas por ter plagiado uns artigos. Se foram esses os métodos ensinados pelos seus professores ou se os ensina aos seus alunos, não me espanta que questione a sua utilidade como professora, pois lhe bastará mandar os estudantes à Internet para fazer “copy & paste” de um qualquer artigo! Mas a memória é curta... e este país parece sofrer de amnésia crónica.
E eu, professora do Ensino Secundário, por vocação e escolha, me confesso: ao fim de 35 anos de dedicação exclusiva ao ensino, senti-me esventrada até ao âmago da alma pela agudeza da pergunta e tentei encontrar uma (possível) resposta que gostaria de partilhar com o mundo. Para que servem, então, os professores?
Servimos, em primeiro lugar, como bombo da festa e consolo nacional para a ignorância, mediocridade e incompetência que grassa transversal e perpendicularmente em todas as profissões (sem excepção!) deste país; presumo, a julgar pela atitude da plateia, que não tivemos, nem temos, qualquer crédito na formação dos bons, dos competentes e dos cultos. Se os portugueses estão na cauda da Europa, não é por falta de habilitações, nem por trabalharem mal, mas por terem tido maus professores!
Servimos de desculpa e bode expiatório para a impossibilidade, incapacidade ou desinteresse dos pais (quantos destes naquela plateia?), encarregados de educação e outros familiares em ensinarem aos filhos, nos primeiros anos da infância, os princípios morais e cívicos, tão necessários à formação do indivíduo. Como poderá a escola impor hábitos de higiene, de delicadeza, de disciplina e outros igualmente básicos a alunos adolescentes, quando os não tiveram na infância? Servimos, assim, para assediar os pais com chamadas à escola, incomodando-os com ninharias como as faltas injustificadas, mau comportamento ou o desinteresse dos filhos.
Servimos também para arcar com as culpas e responsabilidades do falhanço continuado de reformas impostas por sucessivos Ministérios, feitas muitas vezes “sobre o joelho” e por gente que desconhece a realidade escolar e aposta no facilitismo para mascarar o insucesso.
Servimos de trampolim para muitos “chicos-espertos” fazerem carreira à custa do nosso trabalho e da nossa dedicação, apesar das condições miseráveis das nossas escolas.
Servimos para muita coisa, pelos vistos, menos para ensinar as matérias das nossas disciplinas, porque passamos o tempo a tentar que os adolescentes se comportem com civismo, sentados (sim, C. P. Correia, um acto tão simples como ficarem sentados 45 m) a uma mesa, a trabalhar numa aula de Português ou de Matemática, sem gritos, sem conversa, sem música de telemóveis, para só falar nos males menores.
Servimos de pano para toda a obra, nas nossas escolas, mas servimos, acima de tudo, para amar os nossos alunos, para os compensar das muitas carências afectivas, mesmo quando nos rejeitam, para tentar ensinar-lhes, embora remando contra a maré de bruteza desta sociedade que os tritura, que há valores que são eternos, como os diamantes e, como eles, igualmente preciosos.
Deana Barroqueiro
Escritora e Professora do E. Secundário
Deana,
concordo consigo em quase tudo, excepto na sua visão parcial do problema. Também há professores que não se interessam minimamente pelos seus aluno e pelo ENSINO em geral. Já agora quantas vezes é que foi avaliada durante a sua carreira? E como é que essas avaliações funcionam?
Não deixo de concordar que os principais educadores são o meio familiar mas criticar esse ponto é muito perigoso, principalmente para a classe política.
Não me posso queixar dos professores que tive, alguns melhores, outros piores, mas acho que ter estudado numa escola semi-pública ajudou. Já agora posso deixar mote para o resto do post, porquê esta diferença entre o público e o privado? Será uma questão de dinheiro, ou uma questão de fiscalização, será uma questão de condições, ou os alunos que frequentam estas escolas apresentam outro nível de educação e voltamos ao problema "família" para explicar o problema Português?
B.
B., e não pretendi dizer que todos os professores são bons, há bons e maus, como em todas as profissões, o que me revolta é o modo como se generaliza em relação aos professores, parece que se tornou moda responsabilizar-nos pelo insucesso e abandono escolar, quando toda a sociedade é responsável por isso. Há muita gente que se torna professor, por não ter emprego nas suas próprias profissões ou para fazer uns biscates, enquanto não aparece coisa melhor. Quanto a mim, fui avaliada várias vezes, primeiro com um estágio de 2 anos, a dar simultaneamente aulas a 4 ou 5 turmas, com avaliação constante de 2 professores do E. Secundário e de 1 Universitário. Para cada mudança de escalão (estou no último), fiz várias acções de formação (sérias e ligadas às minhas disciplinas Port/Fr), com trabalhos escritos, para além dos relatórios e de outras avaliações por equipas do Ministério, portanto exteriores à escola, onde se pode ver como dava aulas e fazia desenvolver o trabalho dos meus alunos (existem 4 obras publicadas com os trabalhos de alunos de várias turmas, num período de 5 anos). Fiz dois anos de um Mestrado e escrevi uma tese que, todavia, não quis defender, por não me interessar o canudo ou a universidade, mas porque acredito na formação contínua de qualquer profissional (e que é descurada no nosso país) mas entreguei a tese e 2 dossiers de materiais no Ministério, se deles se quisessem servir.
Mas também, ao longo dos meus 35 anos de professora, fiz dezenas de projectos que me ocuparam outras tantas horas, além das tais 22 que tinha de dar, sem nunca ter recebido o pagamento de uma hora extraordinária – ocupando os tempos livres de dezenas de alunos com grupos de teatro e encenando peças (10), fazendo exposições, escrita criativa, cursos de culinária e tantas outras coisas, caro (a) B., que nunca foram avaliadas, nem tomadas em conta pelo Ministério de Educação e as minhas notas, como as de milhares de professores como eu, foram sempre de Satisfaz, exactamente iguais aos do turistas e biscateiros do Ensino. E não me arrependo, pelo contrário, fá-lo-ia de novo, se já não estivesse velha de 60 anos e semi-cega.
E, sabe uma coisa, B.? Se o ensino oficial fosse pago e caro como o particular, talvez não se ouvisse dizer aos meninos nos programas de TV, que no colégio têm de trabalhar para as explicações, “porque os pais pagam um balúrdio e os obrigam a estudar”, mas que na escola é outra coisa.
Deana Barroqueiro
Cumprimento Deana Barroqueiro pelo seu texto "Para que servem os professores?" e pela resposta dada a B. que subscrevo, na íntegra.
Pretende-se atribuir aos professores todas as responsabilidades pela situação caótica do ensino e da educação.
Os professores são o bode expiatório daqueles que querem alijar as suas responsabilidades.
Pais, sociedade civil, em geral, e políticos demitem-se das suas funções e remetem à Escola a tarefa que a todos diz respeito.
Quando me confronto com algumas opiniões de pessoas que, teoricamente, deviam analisar racionalmente as situações, tenho pena que não possam enfrentar, no seu dia a dia, 1, 2, 3 ou 4 turmas de crianças ou de adolescentes.
De certeza que mudariam a sua opinião em três tempos e muitas desistiriam ou teriam de recorrer a psiquiatras.
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