As Forças Armadas, Hoje
O EXÉRCITO e as forças armadas de um país soberano costumavam ser legitimados pela sua função específica: a defesa do solo nacional perante qualquer ameaça externa.
Em Portugal isso aconteceu pela última vez na Guerra da Restauração (1640-1688).
Quando Napoleão resolveu invadir Portugal a opção de resistência militar nem sequer foi considerada. Nesse novo mundo, a função tradicional tinha caducado.
A guerra colonial que forneceu às forças armadas uma função alternativa e a guerra fria, com a participação portuguesa na NATO, adiaram o problema. Mas ele ai está de novo e com toda a urgência.
Para que podem servir e como podem ser legitimadas as forças armadas hoje?
A sua função tradicional já não existe. Ainda há militares que falam do perigo espanhol e da necessidade de ter forças perto da fronteira, recusando-se a olhar para o mundo de hoje em que se deve pensar no modo como as despesas militares podem ser utilizadas como instrumento de política externa do Estado português e de como poderemos ter pequenos corpos de elite para as bósnias e os afeganistões. Os múltiplos desafios dos estados falhados e dos estados párias que, ao que tudo indica, se vão multiplicar.
Contudo ao lado deste vector militar com formas novas é impossível não pensar em outras funções para as forças armadas. Ou em outras missões, para usar uma linguagem militar.
É impossível aceitar que aqueles milhares de homens estacionados em quartéis e prontos para embarcar para qualquer parte do mundo não possam ser usados como mão-de-obra adicional de elevada qualificação para desembarcar de helicópteros e combater fogos naqueles poucos meses em que há incêndios.
Se gastamos alguns milhões na força aérea esta tem que ser mais rápida quando se trata de socorrer náufragos. Os militares têm que compreender que as formas tradicionais de legitimação – morrer pela Pátria – não servem para os dias de hoje. Mesmo sem ser preciso recordar que quando, em Goa, Salazar lhes exigiu que o fizessem quase todos se recusaram.
As formas de legitimação que hoje se exigem são outras e por isso, em vez das manifestações de ofendido repúdio com que reagem aos esforços desesperados do Governo para reduzir as despesas militares – ou as despesas com a educação ou a saúde uma vez que a alternativa é o IVA a 30% - melhor seria que se pensassem como grupo e propusessem alternativas.
Em vez de procurar defender tudo – e conhecem certamente o princípio estratégico que quem quer defender tudo não defende nada - deveriam procurar defender o que fosse defensável.
Em vez de milhares e milhares vegetando em quartéis sem verba para manobras, alguns corpos de elite bem equipados. Em vez de uma marinha com fragatas e submarinos e sem combustível um corpo mais pequeno que policie a costa. Em vez de uma aviação com aviões encaixotados um corpo mais pequeno que sirva para alguma coisa.
É isso que o país espera que façam: propostas e projectos para a criação de uma estrutura mais útil e mais barata.
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