11.8.07

AS INSTÂNCIAS DO DINHEIRO

Por Baptista-Bastos
A PÁTRIA DITOSA, ILETRADA E ABÚLICA, foi instigada à curiosidade por uma luta de galos, cuja natureza naturalmente lhe escapa. O assunto que divide os dois grandes dirigentes do Millenium BCP é, acaso, arrebatador mas, claramente, nada original. Um deseja modificar; o outro nega a mudança. Não têm semelhanças com as personagens do Rei Lear; são projecções de Lisboa em Camisa. E a assembleia geral no Porto foi disso testemunho, com avaria cibernética e tudo.
Há uns tempos, Belmiro de Azevedo tornou corriqueiro um acrónimo invulgar para o trânsito corrente das nossas elementares urgências: "opa". O singular vocábulo dominou as conversas de todas as quintas-feiras. Nos outros dias da semana o futebol foi dominante. No entanto, regressou à flor do entendimento quando o loquaz comendador Berardo aplicou o termo às ideias que manifestou sobre o Benfica.
Até então, opa era um modesto substantivo. Significava capa sem mangas, muito própria para uso de membros de confrarias ou de irmandades. Passou a ser uma palavra poderosa, profusa e inquietante. O leve mistério que lhe subjaz foi esclarecido pelas televisões, pelas rádios e pelos jornais. Podemos ser iletrados; porém, destas "opas", ficámos entendidos.
Quando o BCP lançou uma, sobre o BPI, julgávamos estar na posse de todos os segredos. Não estávamos. Aliás, nunca estamos. No universo do dinheiro as coisas passam-se entre mutismos. Teilhard de Chardin doutrinou: "Mesmo na cruz, Cristo não disse tudo." O dr. Ulrich, apesar de exteriormente muito tenso e, ao que consta, intempestivo em demasia, levou a sua avante. E os graves e solenes eng. Jardim Gonçalves e dr. Paulo Teixeira Pinto, irmãos de congregação, de terço e de novena, desavieram-se. Na luta pelo poder não há lealdades irredutíveis nem lembranças queridas. Quando Joe Berardo fala dos 40 guarda-costas que protegem Jardim Gonçalves de perigos medonhos, e de aviões particulares ao serviço de amigos do fundador do BCP, começamos a imaginar uma instância de direitos, fronteiras, mapas e mitologias que escapam ao nosso modesto mundo.
O poder da televisão foi, de novo, concludente. As horas, as emissões e os muitos programas consagrados à "crise" no BCP transferiram os interesses do português comum para a bisbilhotice do que iria acontecer entre dois homens poderosos, membros de uma congregação secreta. Nenhum português fora do cenáculo apoiava um, em detrimento do outro. A questão é mais simples do que transparece. Afinal, este assunto não nos diz respeito: é lá com eles. E, como é lá com eles, tudo voltará a ser como dantes, com delicadas alterações.
«DN» de 8 de Agosto de 2007

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1 Comments:

Blogger R. da Cunha said...

Um bom artigo, como é da praxe.
Não concordo, no entanto com o de que "é lá com eles". Aquela guerra mexe, não apenas com interesses particualares, mas também com interesses nacionais, pois que envolve um banco estruturante do nosso sistema financeiro.

11 de agosto de 2007 às 19:14  

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