25.8.07

Os profissionais da banhada

Por Lucas de Salimaso
NÃO, O TÍTULO DESTE TEXTO nada tem a ver com os políticos do nosso país. Hoje o tema desta crónica blasfema é a tradição secular de uma localidade em Esposende, com o nome de São Bartolomeu do Mar. Devo previamente informar que respeito todas as formas de crença e convicções religiosas.
Os “banhos santos” foram cumpridos pelos populares durante o dia ontem, 24 de Agosto, dia de São Bartolomeu. Das raízes antropológicas de tal tradição cultural e religiosa pouco sei, apenas que remonta ao Séc. XVII. Com todo o respeito que as crenças dos outros me merecem, não deixa de me espantar que no Séc. XXI se acredite ainda que mergulhar uma criança em água bastante fria (porque assim foi este ano), forçando-a mesmo que não queira, possa curar a epilepsia, entre outras maleitas menos graves. Bem sei que a fé move montanhas, e com isso me ficaria, indiferente a este acto, porque os desígnios da fé só Deus os conhece. Mas os contornos da cerimónia vão mais longe. Não encontrarão nem nos escritos bíblicos (incluindo os apócrifos), nem nos dogmas católicos, razão para o que vos vai ainda ser descrito.
Afiança (aqui) o padre António Frankelin Neiva Soares à Agência Ecclesia que, para curar as mais diversas doenças, os banhos devem ser em número ímpar, “pois o número ímpar está ligado ao masculino e ao mais forte”. Quer isto dizer (digo eu) que o masculino é forte e o feminino é fraco. Pois sim, estamos bem, se o padre pensa assim. Calculo que a sua mãe (do padre), que o pôs ao mundo, fosse então fraca e o seu pai fosse forte. Claro que quem suportou as dores foi ela, mas o forte era ele, o pai, por ser masculino.
Continuando, que o ritual não está completo ainda. Implica que se dê ainda umas quantas voltas à igreja da freguesia (creio que em número também ímpar, porque é masculino, forte). E tem que se passar por baixo do andor. Mas não se passa por baixo do andor de uma maneira qualquer, tem que ser com uma galinha preta debaixo do braço: o misticismo pagão e a religião de mãos dadas.
Quais vendilhões do templo no tempo de Jesus, há profissionais da banhada, perdão, pessoas que dão banhos às crianças, por apenas cinco euritos, para quem não quer ou não pode levar os seus próprios filhitos ao “banho santo”. E quem tem galinhas pretas nos dias de hoje? Sim, porque não basta ir ao hipermercado comprar um franguito de cuvete que supostamente foi preto em tempo de vida. Tem que ser uma galinha com penas bem pretas e bem vivinha. Mas tudo se resolve, porque por uns módicos sete euros e meio pode agora cumprir essa secular tradição que cura as doenças das crianças.
Quem disse que os portugueses não têm espírito empreendedor?
Valha-nos São Bartolomeu do Mar!

1 Comments:

Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Estas crenças, sendo do domínio da do Irracional, são quase impossíveis de erradicar.

No entanto, para quem queira tentar argumentar, basta colocar a um desses praticantes a seguinte questão:

«Preciso de saber uma coisa: se um dia eu o vir, a si, com uma apendicite aguda, um ataque cardíaco ou uma perna estraçalhada... quer que o levem às urgências do hospital, ou a um desses curandeiros?»

Quem já fez a experiência, garante que a resposta do "crente" é pronta e sempre a mesma...

25 de agosto de 2007 às 21:03  

Enviar um comentário

<< Home