15.9.07

A IMPORTÂNCIA DAS LOJAS CHINESAS

Por João Miranda
MARIA JOSÉ NOGUEIRA PINTO defende que a Câmara de Lisboa deve estabelecer quotas para lojas chinesas no centro da cidade. Com esta medida pretende reverter a decadência do comércio tradicional. Nogueira Pinto acredita que as lojas chinesas causam a decadência do comércio tradicional. Reparou que os dois fenómenos ocorreram em simultâneo. O período de maior decadência do comércio tradicional coincidiu com o período de maior desenvolvimento das lojas dos 300 e das lojas chinesas. Com base nesta observação deve ter concluído que as lojas de produtos baratos e de baixa qualidade como as lojas dos 300 ou as lojas chinesas causam a decadência do comércio tradicional. Podia ter tirado a conclusão contrária: a decadência do comércio tradicional causa o aparecimento de lojas com produtos baratos e de baixa qualidade. Ou então podia ter tirado uma conclusão ainda mais rebuscada: a decadência do comércio tradicional e o desenvolvimento das lojas de produtos baratos e de baixa qualidade têm uma causa comum.
Numa economia de mercado, as lojas que satisfazem as necessidades dos clientes tendem a ser bem sucedidas. As lojas que ignoram as necessidades dos clientes tendem a ser mal sucedidas. O mesmo acontece com as zonas comerciais. Zonas comerciais que satisfazem as necessidades dos clientes desenvolvem-se. As que ignoram as necessidades dos clientes entram em decadência. O padrão observado por Maria José Nogueira Pinto pode ser explicado pela necessidade dos clientes. A Baixa está em decadência porque os centros comerciais servem melhor as necessidades dos clientes. O comércio tradicional está em decadência porque se encontra na Baixa, um local que não serve tão bem as necessidades dos clientes como os centros comerciais. As lojas chinesas estão a desenvolver-se porque, apesar de tudo, servem melhor as necessidades dos clientes que se deslocam à Baixa do que o comércio tradicional.
E agora outra ideia radical: há pessoas que só se deslocam ao centro de Lisboa por causa das lojas chinesas. As pessoas com poder de compra que querem produtos de qualidade vão aos centros comerciais. As pessoas com baixo poder de compra vão às lojas chinesas. A eliminação das lojas chinesas não levará as pessoas com elevado poder de compra à Baixa. Essas pessoas preferem os centros comerciais. Mas afastará da Baixa todos aqueles que lá vão por causa das lojas chinesas. Nogueira Pinto tem de enfrentar a dura realidade. Não são as lojas chinesas que causam a decadência da Baixa. As lojas chinesas estão a retardar a decadência da Baixa. Ao contrário do que diz Nogueira Pinto, as lojas chinesas não estão a acabar com o comércio na cidade. Elas são uma parte importante do comércio na cidade.
«DN» de 15 de Setembro de 2007-[PH]

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1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Vamos às compras (*)

Por exemplo às Perfumarias Marionnaud.

Não havia nada mais francês do que esta cadeia de perfumarias. Não eram apenas os perfumes a contribuir para isso. Desde a forma como as empregadas se apresentavam, as regalias excepcionais que usufruíam... tudo contribuía para que as Perfumarias Marionnaud fossem, a par dos croissants, um símbolo do charme francês. E o charme ou melhor dizendo o desejo dele é um estímulo a não menosprezar na hora de convencer alguém a pagar uma barbaridade por um líquido amarelado encerrado dentro dum frasquinho.

Desde que no passado sábado li a entrevista de Maria José Nogueira Pinto no semanário “Expresso” sobre o seu desígnio de “travar a proliferação das lojas chinesas” na Baixa de Lisboa que me interrogo sobre o destino de cadeias como as Perfumarias Marionnaud. É que as Perfumarias Marionnaud são lojas chinesas. Ou melhor esta cadeia de perfumarias é propriedade dum grupo chinês que graças a esta aquisição se terá tornado o maior distribuidor mundial de perfumes. Vamos ficar sem perfumarias na Baixa? Ou será que ser propriedade dum grupo chinês não é suficiente para se ser uma loja chinesa?

Provavelmente não. Mas afinal o que é uma loja chinesa? Uma loja cujos funcionários têm traços asiáticos? Acreditava eu que desde que desapareceu o preto da Casa Africana que os funcionários não são o espelho étnico da casa. Ou será uma loja chinesa um local onde se vendem produtos feitos na China? Nesse caso muitas das lojas da Baixa, da Alta e de todo o país terão de ser deslocadas para a Chinatown almejada por Maria José Nogueira Pinto. Na verdade, loja chinesa na Baixa de Lisboa existe uma, e é conhecida pela qualidade do seu café de saco, coisa nada chinesa tanto quanto sei.

As declarações de Maria José Nogueira Pinto têm contudo outras implicações para lá da discriminação propriamente dita. Em primeiro lugar o que faz Maria José Nogueira Pinto na Câmara Municipal de Lisboa? Oficialmente vai chefiar, em part time, a “unidade de missão para a revitalização da Baixa-Chiado”. Na prática o que os lisboetas vêem é o presidente da CML a bloquear carros e uma pessoa que não foi eleita e que nem sequer se candidatou a perorar sobre o centro da cidade, propondo coisas tão extraordinárias quanto a criação duma Chinatown. Ou acaba aqui esta bizarra situação ou temos mais novela na CML.

Contudo as declarações de Maria José Nogueira Pinto sobre o que designa como “pequeno comércio” merecem também elas a maior atenção. Afinal o ranço que sobressai desses considerandos não é menor do que aquele que expressa quando teoriza sobre os comerciantes chineses: “deitar mão ao pequeno comércio” é a intenção de por Maria José Nogueira Pinto. Na verdade há anos que andamos a deitar a mão ao pequeno comércio e ao seu clone idoso, o comércio tradicional. Essa protecção tem sido feita à custa dos direitos dos consumidores, senhorios e investidores. Como tal não se tem revelado suficiente só resta dificultarem o mais possível que façamos compras onde queremos.
Por exemplo, quem se lembra das propostas da Associação dos Comerciantes do Porto quando confrontada com o facto de, nos últimos 15 anos, 20% das lojas portuenses terem fechado? A resposta foi óbvia: redução dos horários e encerramento ao domingo dos hipers e centros comerciais. Podia lá ser outra coisa?
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(*) Helena Matos - PÚBLICO, 13 de Setembro de 2007

16 de setembro de 2007 às 12:00  

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