6.3.08

A exumação do padre Pio

Por C. Barroco Esperança
A MÓRBIDA ATRACÇÃO POR CADÁVERES é uma pia inclinação que em Itália ocupa espaço em numerosas igrejas e respectivas criptas. Já o Santo Ofício fazia exumações para queimar os restos de defuntos, desolado por não os ter podido queimar em vida.
Agora é para glorificar um santo que João XXIII considerava embusteiro e que João Paulo II, especialista em santidade, não deixou escapar à canonização. Bento XVI não prescinde de o exibir em público, contrariando a vontade da família.
Das diversas vezes que visitei Itália, apesar de conhecer o péssimo gosto e a doentia obsessão que criou a «capela dos ossos» em Évora, dei-me conta de que nenhum outro País exibe um tão rico património de despojos humanos como tesouros das suas igrejas magníficas e deslumbrantes catedrais.
Recordo sempre a guia turística que, depois de enaltecer longamente as virtudes de um santo cujo esqueleto era testemunho da sua existência pia, interrogada sobre a origem do esqueleto mais pequeno que lhe fazia companhia, o atribuiu ao mesmo santo… quando era mais novo.
Não sei de onde vem a devoção macabra, a necrofilia eclesiástica que conduz à tétrica exibição de um morto com quarenta anos de defunção. Esta lúgubre exposição é uma profanação de cadáver em qualquer país civilizado mas, com autorização do Vaticano e aspersão de água benta, é um acto pio que rende indulgências aos visitantes por entre fumos de incenso para camuflar o odor.

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1 Comments:

Blogger Blondewithaphd said...

Ora aqui está uma coisa que nunca percebi nos povos do Meridião! A morbidez cultuada.
Sinto-me tentada a invocar o Antero de Quental que dizia que a "causa da decadência dos povos peninsulares", acrescento dos povos meridionais, era o Catolicismo.
Estou tentada, é verdade, mas isso é um bocado politicamente incorrecto, não é? Alguém me viria já crucificar e exibir os meus despojos e, afinal, também, eu até sou católica.
Ó paradoxo de um raio!

6 de março de 2008 às 18:10  

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