Não há bela sem senão
A propósito do custo dos combustíveis, está outra vez na berra o tele-trabalho como um dos muitos meios para eliminar deslocações não necessárias. Esse assunto foi abordado nesta pequena história, intitulada «Redução de Custos» (*), que aqui fica para que se veja como nem sempre as coisas são tão fáceis como parecem.
-oOo-
Ia uma grande agitação na Makro-Teknika: o Relatório de Contas indicava resultados desastrosos e impunha-se uma redução de custos… a todo o custo. E Jeremias achou que tinha chegado a sua hora de glória.
Pobre ingénuo!
*
*
O NOSSO JOVEM começou, de novo e desta vez com forte alento, a pregar as vantagens das novas tecnologias na economia de custos da empresa.
E não se ficou apenas pelas prédicas nem pelos palpites: resolveu fundamentar as suas opiniões e fez algumas contas…
Vamos dar com ele no gabinete do Doctor Robert, que o escuta, compreensivo:
E não se ficou apenas pelas prédicas nem pelos palpites: resolveu fundamentar as suas opiniões e fez algumas contas…
Vamos dar com ele no gabinete do Doctor Robert, que o escuta, compreensivo:
— Pois é, amigo Jeremias… Tu até tens alguma razão… Mas não estás a ter em conta o reverso da medalha: já imaginaste quantas horas de formação seriam necessárias para ensinar alguns voluntários que aqui tenho a ligar um computador?!
E continuava, desalentado, batendo na mesa com os nós dos dedos:
— Ainda se eu tivesse a certeza que esses gajos aprendiam!…
De facto era verdade e Jeremias já contava com essa reacção. Por isso trazia na manga um argumento infalível:
— Chefe, isso está tudo muito certo. Compreendo que, para poupar 10 ou 20 contos em faxes, não valha a pena gastar 100 ou 200 a ensinar certas pessoas a enviar um e-mail. Mas já não será o mesmo no que toca ao Professor Delírios…
E aqui o nosso amigo interrompeu-se e ficou à espera da reacção do chefe que já sabia que havia de vir... Remexendo-se na cadeira, não escondendo uma enorme incomodidade decerto fruto de anteriores peripécias e dissabores, o Doctor Robert rosnou, numa voz arrastada que prenunciava grossa tempestade:
— O que é que se passa agora com essa tarântula?!
E continuava, desalentado, batendo na mesa com os nós dos dedos:
— Ainda se eu tivesse a certeza que esses gajos aprendiam!…
De facto era verdade e Jeremias já contava com essa reacção. Por isso trazia na manga um argumento infalível:
— Chefe, isso está tudo muito certo. Compreendo que, para poupar 10 ou 20 contos em faxes, não valha a pena gastar 100 ou 200 a ensinar certas pessoas a enviar um e-mail. Mas já não será o mesmo no que toca ao Professor Delírios…
E aqui o nosso amigo interrompeu-se e ficou à espera da reacção do chefe que já sabia que havia de vir... Remexendo-se na cadeira, não escondendo uma enorme incomodidade decerto fruto de anteriores peripécias e dissabores, o Doctor Robert rosnou, numa voz arrastada que prenunciava grossa tempestade:
— O que é que se passa agora com essa tarântula?!
Ora cabe aqui explicar que o Professor Delírios era o responsável máximo do Controlo da Perfeição. O homem sabia tudo e mais alguma coisa sobre os standard ISO, NP, DIN e VDE… Até a dormir era capaz de recitar as normas de projecto e de fabrico, recomendações e resoluções dos mais incríveis organismos internacionais… Enfim, pelo menos nesses assuntos, ninguém discutia com ele! E, juntando a essa sabedoria toda uma boa pitada de mau-feitio, o homem fizera uma carreira imparável na Makro-Teknika. E ninguém se atrevia a contrariá-lo, nem mesmo o todo-poderoso Doctor Robert!
Ora o que Jeremias agora propunha era – nada mais nada menos – que se usassem os novos métodos de Tele-Qualidade, alterando os hábitos ancestrais do professor Delírios: acontecia que o Professor Delírios tinha que se deslocar todas as semanas à Beira-Alta para assistir aos ensaios de recepção na fábrica que produzia os lápis para a Makro-Teknika.
Daí, o grande interesse em começar a usar a Tele-Qualidade…
Mas o Professor Delírios já se tinha encarregado de o mandar estar quieto:
— Não me chateie, menino Jeremias. Você, que nasceu ontem, julga que não houve já quem pensasse nisso?!
Jeremias estava habituado a esse tipo de respostas: se a ideia era má… só mostrava como era estúpido. Se era boa, já alguém pensara nisso…
Quanto ao motivo porque as coisas não se faziam… isso era outra história…
Ora o que Jeremias agora propunha era – nada mais nada menos – que se usassem os novos métodos de Tele-Qualidade, alterando os hábitos ancestrais do professor Delírios: acontecia que o Professor Delírios tinha que se deslocar todas as semanas à Beira-Alta para assistir aos ensaios de recepção na fábrica que produzia os lápis para a Makro-Teknika.
Daí, o grande interesse em começar a usar a Tele-Qualidade…
Mas o Professor Delírios já se tinha encarregado de o mandar estar quieto:
— Não me chateie, menino Jeremias. Você, que nasceu ontem, julga que não houve já quem pensasse nisso?!
Jeremias estava habituado a esse tipo de respostas: se a ideia era má… só mostrava como era estúpido. Se era boa, já alguém pensara nisso…
Quanto ao motivo porque as coisas não se faziam… isso era outra história…
Mas, neste caso, o motivo parecia que era forte, e a gargalhada do Doctor Robert deve ter-se ouvido na estrada, a quinhentos metros dali:
— Deves ser o único que não sabe! É que o Delírios, à força de ir todas as semanas à Beira-Alta, arranjou por lá uma amiga que… bem… digamos que o trata com carinho… E agora vais tu querer que ele adira à Tele-Qualidade?! Só quando se inventar a Tele-Marmelada!
— Deves ser o único que não sabe! É que o Delírios, à força de ir todas as semanas à Beira-Alta, arranjou por lá uma amiga que… bem… digamos que o trata com carinho… E agora vais tu querer que ele adira à Tele-Qualidade?! Só quando se inventar a Tele-Marmelada!
(*) Cap. 24 de «Operação JEREMIAS» (Ed. BaleiAzul, 1999) - desventuras de Jeremias, jovem engenheiro contratado para tentar modernizar uma típica empresa portuguesa. O livro, que está esgotado, pode ser lido [aqui] e [aqui]. Outras aventuras do infeliz herói também podem ser lidas [aqui].
Etiquetas: CMR
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