Uma agonia chamada Museu Nacional de História Natural
Por A. M. Galopim de Carvalho
No momento que estamos a viver, um momento particularmente preocupante para a vida dos museus sedeados na Escola Politécnica, e a fim de colocar responsabilidades nos seus respectivos agentes, é oportuno recordar um desabafo que publiquei, na introdução do volume nº 15 de “GAIA”, a Revista de Geociências do Museu Nacional de História Natural, de há oito anos (*), era eu ainda director desta instituição da Universidade de Lisboa.
No momento que estamos a viver, um momento particularmente preocupante para a vida dos museus sedeados na Escola Politécnica, e a fim de colocar responsabilidades nos seus respectivos agentes, é oportuno recordar um desabafo que publiquei, na introdução do volume nº 15 de “GAIA”, a Revista de Geociências do Museu Nacional de História Natural, de há oito anos (*), era eu ainda director desta instituição da Universidade de Lisboa.
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COM UM QUADRO DE PESSOAL EM EXTINÇÃO, um orçamento estatal praticamente inalterado desde 1985 (há 15 anos) e as conhecidas e deploráveis condições em que se encontra, o Museu Nacional de História Natural sobrevive e teima em afirmar a sua vocação de entidade promotora de investigação e de divulgação científicas, cuja obra, conhecida pelos seus pares nacionais e estrangeiros e pelo público português, lhe conferem um prestígio que contrasta com a atenção que lhe tem sido dispensada pela Administração. Uma tal situação, que caracteriza o seu dia-a-dia no seio da maior Universidade do País, arrasta-se sem esperança de solução, desde o incêndio da Faculdade de Ciências, há vinte e dois anos. Uma tragédia que não só o destruiu em grande parte, como o privou do convívio vivificante dessa Faculdade, de que era estabelecimento anexo. Vinte e dois anos de luta empenhada, com muito trabalho realizado dentro e fora dos seus espaços esventrados, vazios e em tosco, sem qualquer eco por parte dos sucessivos governos, num desinteresse só explicável pela tradicional falta de cultura científica dos portugueses, incluindo governantes, com a natural e óbvia excepção de um ou outro oriundo do sector científico. No que toca a sua tutela mais directa, é justo lembrar a muita simpatia que sempre lhe foi dispensada pelos sucessivos reitores que, sem excepção e na medida das suas também poucas possibilidades, nos foram e vão dando respostas pontuais a muitas das solicitações que lhes foram e são dirigidas. Nunca, porém, a Universidade assumiu frontal, empenhada e visivelmente qualquer acção de fundo no sentido de inverter este deslizar para o fim, revalorizando um património científico e cultural que herdou da velha Escola Politécnica, a caminho de dois séculos ao serviço das Ciências da Natureza. Com o peso enorme que tem, e de que se não se dá conta, a Universidade de Lisboa, com os seus milhares de alunos e professores, muitos destes personalidades de elevada posição no tecido social e político, não teria dificuldade em mobilizar a opinião pública e assim pressionar o poder a fazer aquilo que ele nem se lembra que também faz falta aos portugueses. Continuamos, assim, a gerir a crise, agora com encorajamentos à produção de receitas próprias, numa política talvez inspirada de cima mas que esquece os deveres do Estado na promoção cultural dos seus cidadãos. Neste quadro é lícito admitir que a Universidade de Lisboa, no seu todo, enorme na dimensão e nas suas múltiplas e vastas preocupações e sensibilidades, tem vindo a arrastar, como um fardo, este seu valioso sector de investigação e de contacto com o grande público, que só não deixa cair porque isso, vergonha das vergonhas, seria a negação inaceitável da sua própria essência.
COM UM QUADRO DE PESSOAL EM EXTINÇÃO, um orçamento estatal praticamente inalterado desde 1985 (há 15 anos) e as conhecidas e deploráveis condições em que se encontra, o Museu Nacional de História Natural sobrevive e teima em afirmar a sua vocação de entidade promotora de investigação e de divulgação científicas, cuja obra, conhecida pelos seus pares nacionais e estrangeiros e pelo público português, lhe conferem um prestígio que contrasta com a atenção que lhe tem sido dispensada pela Administração. Uma tal situação, que caracteriza o seu dia-a-dia no seio da maior Universidade do País, arrasta-se sem esperança de solução, desde o incêndio da Faculdade de Ciências, há vinte e dois anos. Uma tragédia que não só o destruiu em grande parte, como o privou do convívio vivificante dessa Faculdade, de que era estabelecimento anexo. Vinte e dois anos de luta empenhada, com muito trabalho realizado dentro e fora dos seus espaços esventrados, vazios e em tosco, sem qualquer eco por parte dos sucessivos governos, num desinteresse só explicável pela tradicional falta de cultura científica dos portugueses, incluindo governantes, com a natural e óbvia excepção de um ou outro oriundo do sector científico. No que toca a sua tutela mais directa, é justo lembrar a muita simpatia que sempre lhe foi dispensada pelos sucessivos reitores que, sem excepção e na medida das suas também poucas possibilidades, nos foram e vão dando respostas pontuais a muitas das solicitações que lhes foram e são dirigidas. Nunca, porém, a Universidade assumiu frontal, empenhada e visivelmente qualquer acção de fundo no sentido de inverter este deslizar para o fim, revalorizando um património científico e cultural que herdou da velha Escola Politécnica, a caminho de dois séculos ao serviço das Ciências da Natureza. Com o peso enorme que tem, e de que se não se dá conta, a Universidade de Lisboa, com os seus milhares de alunos e professores, muitos destes personalidades de elevada posição no tecido social e político, não teria dificuldade em mobilizar a opinião pública e assim pressionar o poder a fazer aquilo que ele nem se lembra que também faz falta aos portugueses. Continuamos, assim, a gerir a crise, agora com encorajamentos à produção de receitas próprias, numa política talvez inspirada de cima mas que esquece os deveres do Estado na promoção cultural dos seus cidadãos. Neste quadro é lícito admitir que a Universidade de Lisboa, no seu todo, enorme na dimensão e nas suas múltiplas e vastas preocupações e sensibilidades, tem vindo a arrastar, como um fardo, este seu valioso sector de investigação e de contacto com o grande público, que só não deixa cair porque isso, vergonha das vergonhas, seria a negação inaceitável da sua própria essência.
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COM OUTRA HISTÓRIA, bem mais recente, mas igualmente triste, o Museu de Ciência tem sido, desde o seu início, o nosso companheiro nesta travessia do deserto. Detentor de invulgar património científico e cultural como são, por exemplo, a sua preciosa biblioteca, com primeiras edições de grandes nomes da Ciência, com o seu magnífico laboratório de Química, única relíquia do séc. XIX, e com um trabalho pedagógico igualmente notável, esta outra dependência da Universidade de Lisboa, não está melhor do que nós e, igualmente, desespera. Há, pois, que encontrar uma solução para estes Museus, de preferência com a Universidade, mas, se necessário, fora dela. É uma responsabilidade da nossa geração, universitários, governantes, cidadãos em geral. Todos seremos julgados pelo quase nada que fizemos e pelo muito que deixámos por fazer.
NO DIA MUNDIAL dos museus, data que sempre recordamos mas não festejamos, aqui fica a expressão do desencanto e da mágoa de quem sente que sai derrotado após quarenta anos ao serviço da Universidade, um terço dos quais neste Museu, com a enorme frustração de não ter podido ou sabido levar a bom termo esta causa.
(*) 18 de Maio de 2 000; as crónicas que o autor aqui afixa estão também disponíveis no seu blogue-arquivo Sopa de Pedras.
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