Passatempo-relâmpago
EM CIMA, vê-se o título de uma notícia relativa a um assunto muito falado nos últimos dias: a reacção das autarquias à abolição da taxa dos contadores (que lhes garantia uma receita não desprezável).
Em baixo, vêem-se duas ilustrações que Gustave Doré fez para o capítulo IV de «D. Quixote de la Mancha».
Pergunta com prémio: qual a associação de ideias que levou a juntar aqui a notícia e as famosas gravuras?
Actualização-1 (20h20m): se, até às 12h de amanhã (dia 26 de Maio), não houver mais nenhum comentário, dá-se o passatempo por encerrado, considerando como boas as respostas dadas até este momento.
Actualização-2: embora o comentário de 'Musicólogo' esteja correcto, o primeiro a dar a resposta pretendida (relacionando a notícia do «Público» com a história do cabreiro) foi Luís Bonito - que, por isso e na minha opinião, é o vencedor do passatempo. Obrigado a ambos!
Etiquetas: CMR, Passatempos
7 Comments:
Ao fim e ao cabo temos que ser sempre nós a pagar.
Quando D. Quixote interveio e parou o patrão de continuar a castigar o rapaz pelas perdas do rebanho, exigiu-lhe que pagasse ao rapaz o que lhe devia. Então, o patrão logo arranjou outras desculpas para não pagar, alegando que tinha dado ao rapaz 3 pares de sapatos e 2 folgas quando ele tinha estado doente...
Ou seja de uma forma ou de outra o pobre tinha sempre que pagar...
Mas houve uma continuação, relacionada com a tareia que o puto estava a levar e que D. Quixote interrompeu.
Qual foi?
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(Curiosidade: A ortografia do séc. XIX era 'Quichote')
Bem , o que aconteceu é que mesmo depois de jurar ao D. Quixote que pagaria a dívida, logo que o cavaleiro se foi embora ele prendeu o rapaz e voltou a chicoteá-lo.
Ou seja deu o dito por não dito.
Exacto.
O patrão deu ao puto o resto da tareia que faltava dar, e ainda mais algumas correadas 'de brinde' - o que D. Quixote, se não fosse tonto, saberia que ia suceder quando virasse costas.
Neste caso das taxas dos contadores, os deputados armaram-se em defensores quixotescos dos consumidores. Estes, mal o defensor acabou de legislar, levaram outra porrada 'para compensar'...
A questão da taxa dos contadores é grave porque a Assembleia da República considerou essa taxa inconstitucional, depois as autarquias deram-lhe a volta, e aplicaram a mesma mas com outro nome.
Apareceu na Tv um senhor do Governo (secretário ou sub-secretário de estado) a dizer que era um problema que as associações de defesa dos consumidores deviam resolver...
Ou seja, não era nada com ele e "lavou as mãos".
Parece que cada um faz o quer, mas pagam sempre os mesmos.
(...)
Aos primeiros passos que deu no bosque, viu uma égua presa a uma azinheira, e atado a outra um rapazito nu da cinta para cima, é de seus quinze anos; era o que se lastimava, e não sem causa, porque o estava com uma correia açoitando um lavrador de estatura alentada, acompanhando cada açoite com uma repreensão e conselho, dizendo:
— Boca fechada, e olho vivo!
Ao que o rapaz respondia:
— Não tornarei mais, meu amo, pelas Chagas de Cristo, prometo não tornar! prometo daqui em diante tomar mais sentido no gado!
Vendo D. Quixote aquilo, exclamava furioso:
— Descortês cavaleiro, mal parece haverdes-vos com quem vos não pode resistir; subi ao vosso cavalo, e tomai a vossa lança — (que arrumada à azinheira estava de feito uma); — eu vos farei conhecer que isso que estais praticando é de covarde.
O lavrador, que viu iminente aquela figura carregada de armas, brandindo-lhe a lança ao rosto, deu-se por morto, e com reverentes palavras lhe respondeu:
— Senhor cavaleiro, este rapaz que estou castigando é meu criado; serve-me de guardar um bando de ovelhas, que trago por estes contornos; mas é tão descuidado, que de dia a dia me falta uma; e, por eu castigar o seu descuido ou velhacaria, diz que o faço por forreta, para lhe não pagar por inteiro a soldada; por Deus, e em minha consciência, que mente.
— Mente na minha presença, vilão ruim?! — disse D. Quixote — Voto ao sol que nos alumia, que estou, vai não vai, para atravessar-vos com esta lança; pagai-lhe logo sem mais réplica; quando não, por Deus que nos governa, como neste próprio instante dou cabo de vós; desatai-o de repente.
O lavrador abaixou a cabeça, e sem dizer mais palavra desatou o ovelheiro.
Perguntou-lhe D. Quixote quanto seu amo lhe devia; respondeu ele que nove meses, à razão de sete reales cada mês.
Fez D. Quixote a conta, e viu que somava sessenta e três reales, e disse ao lavrador que lhos contasse logo logo, se não queria pagar com a vida.
Respondeu o camponês, aterrado em tão estreito lance, que já lhe havia jurado (e não tinha ainda jurado coisa alguma) que não eram tantos, porque havia para abater três pares de sapatos que lhe havia mercado, e mais um real de duas sangrias que lhe tinham dado estando enfermo.
— Tudo isso está muito bem — respondeu D. Quixote; — mas os sapatos e as sangrias fiquem em desconto dos açoites que sem culpa lhe destes; porquanto, se ele rompeu o couro dos sapatos que vós pagastes, vós rompestes-lhe o do seu corpo; e se o barbeiro lhe tirou sangue, estando doente, também vós lho tirastes estando ele são; portanto nesse particular não há mais que ver, estamos com as contas justas.
— Pior é, senhor cavaleiro, que não tenho aqui dinheiro comigo; acompanha-me tu a casa, André, que eu lá te pagarei de contado.
— Eu ir com ele? — disse o rapaz outra vez — Mau pesar viesse por mim! não senhor; nem pensar em tal. Se se tornasse a ver comigo a sós, esfolava-me que nem um S. Bartolomeu.
— Tal não fará — respondeu D. Quixote; — basta que eu mande, para ele me catar respeito. Jure-mo ele pela lei da cavalaria que recebeu, deixá-lo-ei ir livre, e dou-te o pagamento por seguro.
— Veja Vossa Mercê, senhor, o que diz — replicou o rapazito; — que este meu amo não é cavaleiro, nem recebeu ordem nenhuma de cavalarias; é João Haldudo, o rico, vizinho de Quintanar.
— Pouco importa isso, — obtemperou D. Quixote — que em Haldudos também pode haver cavaleiros; e demais, cada um é filho das suas obras.
— Isso é verdade — acudiu André; — mas este meu amo, de que obras há-de ser filho, pois me nega a paga do meu suor e trabalhos?
— Não nego tal, meu rico André — respondeu o lavrador; — dá-me o gosto de vir comigo, que eu juro por quantas castas de cavalarias haja no mundo, de pagar, como tenho dito, até à última, e em moedinha defumada.
— Dos defumados vos dispenso eu — disse D. Quixote; — dai-lhe os reales, sejam como forem, e sou contente; e olhai lá se o cumpris, segundo jurastes; quando não, pelo mesmo juramento vos rejuro eu que voltarei a buscar-vos e castigar-vos, e que de força vos hei-de achar, ainda que vos escondais mais fundo que uma lagartixa; e se quereis saber quem isto vos intima, para ficardes mais deveras obrigado a cumprir, sabei que sou o valoroso D. Quixote de la Mancha, o desfazedor de agravos e sem-razões. Ficai-vos com Deus, e não esqueçais o prometido e jurado, sob pena do que já vos disse. Com o que, meteu esporas ao Rocinante, e em breve espaço se apartou deles. Seguiu-o com os olhos o lavrador, e, quando o viu já fora do bosque, e do alcance, voltou-se para o seu criado André, e lhe disse:
— Vinde cá, meu filho, que vos quero pagar o que vos devo, como aquele desfazedor de agravos me ordenou.
— Juro — respondeu André — que muito bem fará Vossa Mercê em cumprir o mandamento daquele bom cavaleiro, que mil anos viva, que, segundo é valoroso e bom juiz, assim Deus me dê saúde, como se me não paga, voltará, e há-de executar o que disse.
— Também eu o juro — disse o lavrador; — mas, pelo muito que te quero, vou primeiramente acrescentar a dívida, para ficar sendo maior a paga.
E travando-lhe do braço, o tornou a atar na azinheira, onde lhe deu tantos açoites, que o deixou por morto.
— Chamai agora, senhor André, pelo desfazedor de agravos — dizia o lavrador; — e vereis como não desfaz este, ainda que, segundo entendo, por enquanto ainda ele não está acabado de fazer, porque me estão vindo ondas de te esfolar vivo, como tu receavas.
Mas afinal desatou-o, e lhe deu licença para ir buscar o seu juiz, que lhe executasse a sentença que dera.
Partiu André algum tanto trombudo; prometendo que se ia à busca do valoroso D. Quixote de la Mancha, para lhe contar ponto por ponto o que era passado, e dizendo que o amo desta vez lhe havia de pagar sete por um.
Assim mesmo porém foi-se a chorar, e o amo se ficou a rir.
(...)
Dá-se um chouriço e pede-se em troca um porco. É típico.
Lembram-se do IVA? Diminui-se o IVA em 1%.
E já ninguém se lembra que ele aumentou de 19 para 21? Se ficar em 20, na realidade continua aumentado de 1%. Já para não falar quando era 17.
É tudo uma mera ilusão, uma mera acalmia de tempestades para calar as revoltas. Mas como o lucro tem de vir e tem, depois pela porta do cavalo lá se arranja outro esquema...
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