28.6.08

As Obras Verdes

Por J. L. Saldanha Sanches
O FIM DA ERA DO PETRÓLEO BARATO está a forçar as sociedades ocidentais à mais dolorosa reconversão das últimas décadas. Os governos têm duas possibilidades: prolongar a agonia do doente com subsídios que adiam a reconversão ou usar os poucos recursos disponíveis para estimular a reconversão e proporcionar ajudas pessoais aos mais atingidos por esta crise.
A escolha está entre o corporate welfare e a ajuda social aos que têm mais dificuldades na adaptação.
As obras públicas são o outro lado da questão. Costumam querer dizer estradas, pontes e túneis. A questão das acessibilidades, como costumam dizer solenemente os senhores autarcas.
Já as temos, e quanto à sua capacidade para fazer crescer a economia estamos conversados. Parece haver mesmo uma relação inversa entre o número de quilómetros de auto-estradas e o crescimento do produto interno bruto.
Na economia pós-petróleo barato, obras públicas só podem ser formas públicas de ajudar a reconversão da economia. Principalmente ajuda às energias renováveis. Se e se for possível fazê-lo bem e não forem criados elefantes brancos com umas manchas verdes.
Estão aí – nas energias renováveis – as únicas boas notícias.
O sol do sul de Portugal – a zona da Europa com mais sol - não serve só para atrair turistas. As notícias animadoras sobre a explosão das centrais solares e a constante baixa de preço da sua produção mostram que temos tantos recursos a médio e longo prazo como se tivéssemos petróleo.
Seria desejável que as autoridades públicas – tão eficientes a criar deveres e encargos que embaraçam a iniciativa privada e não têm qualquer justificação – pelo menos não impedissem que isto aconteça. Como no caso da central solar que estava com dificuldade em aumentar o espaço de construção por faltar licença de utilização de uma reserva agrícola.
A posição do Governo não é fácil, a sua responsabilidade enorme. Os pescadores, os camionistas e os agricultores só querem uma coisa: subsídios que adiem a sua adaptação às novas condições. As construtoras querem empreitadas.
Obras, podemos e devemos ter: transportes de massa confortáveis e rápidos para os grandes centros urbanos que lhes permitam funcionar. Comboios de razoável velocidade que liguem o interior com o litoral (agora com os espanhóis fazer contas é melhor esquecer de vez o TGV) e mais, muito mais, linhas para o transporte de mercadorias. Barragens também, mais auto-estradas não.
Obras públicas verdes em vez de simples acumuladoras de betão.
As reivindicações de ajuda por empresas que vêem na cornucópia de subsídios a sua única salvação é a grande tentação do Governo e o grande perigo para a economia: os agricultores são o melhor exemplo. Falam dos pagamentos devidos pelo Governo e do seu aumento com a tranquilidade e a boa consciência do funcionário que trabalha para o Estado e vive do salário que este lhe paga.
Em vez de procurar formas de produção que reduzam a factura do petróleo, um subsídio maior para o gasóleo agrícola. A cultura dos subsídios perpetua-se e multiplica-se.
Adenda: As palavras irresponsáveis do Ministro da Agricultura que indispuseram gravemente a CAP podiam ter criado um sério problema. O Governo correu o risco de ficar nas mãos com milhões e milhões de subsídios que não iria conseguir distribuir.
«Expresso» de 28 de Junho de 2008 - www.saldanhasanches.pt

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