«A Quadratura do Circo»
O estranho caso do Presidente gagá
Por Pedro Barroso
OS ASSESSORES NÃO PARAVAM de entrar e sair de forma agitada. Os corredores da Presidência manifestavam uma movimentação tensa e invulgar com os protagonistas a entreolharem-se incomodados.
A intervenção presidencial não fora grande coisa, com efeito. Mais; fora prolixa, repetitiva e ambígua, deixando todos desconfortáveis.
O boato instalara-se - e havia que desfazê-lo de raiz…- de que o Presidente estivesse diminuído no seu entendimento, desse ouvidos a quem não merecia, inventasse perseguições e se dissesse e desdissesse em declarações, embrulhado em justificações absurdas.
Sim; que diabo.
Ele era o Presidente de toda a Nação.
Não tinha que justificar-se, nem lançar suspeitas. Nem sobre as suas fontes de informação, nem sobre a sua capacidade de superar as gafes cometidas pelo seu staff.
Nem sequer dar azo a que declarações vindas da Presidência constituíssem dados mal entendidos pelos jornalistas sobre a própria justeza e precisão das suas palavras.
Zangado com a sua entourage, diz-se que decidiu ele próprio elaborar o discurso, e que apenas foi corrigida uma por outra irregularidade ortográfica que lhe tivesse escapado.
Posto isto, satisfeito que ficou com o seu labor de vários dias, convocou toda a Imprensa e de forma muito clara, apesar da voz trôpega da idade não o ajudar muito, esclareceu qualquer coisa como isto:
Esta nota da Presidência destina-se a notificar a Imprensa.
A Imprensa procurou ultimamente explorar uma nota da Presidência para dar a entender que agimos com má fé ou preconceito contra quem quer que fosse.
Com efeito, aparentemente, não foram dezasseis Barragens que inaugurei este ano, mas dezassete. Não quis de todo ofender ninguém, especialmente a última barragem, que em meu entender, já tendo sido por mim visitada, não era propriamente a última, sendo no entanto mais uma das que visitei, num total de dezassete.
Algumas barragens foram visitadas duas vezes, pelo menos, mas outras ainda mais vezes, o que iria perfazer, feitas as contas, mais de uma vintena.
Contudo, como a penúltima já tinha sido visitada aquando da primeira pedra, não a considerei na altura, pois afinal já fora considerada. No fundo, a décima sexta é portanto a décima sétima, ou antes, a décima sétima é, mais precisamente, a décima sexta.
Só espíritos muito obstinados em não perceber é que insistem em não perceber aquilo que é perfeitamente compreensível, incluindo alguns jornalistas que puseram na minha boca ou na de algum dos meus colaboradores aquilo que nunca se disse.
Passou, com efeito, a informação de que eu inaugurara a décima sexta barragem, tal como referi, alias, no meu discurso, onde, no entanto, facilmente se perceberia que eu queria dizer décima sétima.
A bem da Nação, presta-se este esclarecimento, para que tudo fique esclarecido e nenhuma barragem se sinta diminuída na sua importância.
Era o princípio do fim. Nos idos de setenta, a coisa foi bazófia durante meses.
O Presidente estava efectivamente gagá.
Estórias da História, claro. Nada mais.
Por Pedro Barroso
OS ASSESSORES NÃO PARAVAM de entrar e sair de forma agitada. Os corredores da Presidência manifestavam uma movimentação tensa e invulgar com os protagonistas a entreolharem-se incomodados.
A intervenção presidencial não fora grande coisa, com efeito. Mais; fora prolixa, repetitiva e ambígua, deixando todos desconfortáveis.
O boato instalara-se - e havia que desfazê-lo de raiz…- de que o Presidente estivesse diminuído no seu entendimento, desse ouvidos a quem não merecia, inventasse perseguições e se dissesse e desdissesse em declarações, embrulhado em justificações absurdas.
Sim; que diabo.
Ele era o Presidente de toda a Nação.
Não tinha que justificar-se, nem lançar suspeitas. Nem sobre as suas fontes de informação, nem sobre a sua capacidade de superar as gafes cometidas pelo seu staff.
Nem sequer dar azo a que declarações vindas da Presidência constituíssem dados mal entendidos pelos jornalistas sobre a própria justeza e precisão das suas palavras.
Zangado com a sua entourage, diz-se que decidiu ele próprio elaborar o discurso, e que apenas foi corrigida uma por outra irregularidade ortográfica que lhe tivesse escapado.
Posto isto, satisfeito que ficou com o seu labor de vários dias, convocou toda a Imprensa e de forma muito clara, apesar da voz trôpega da idade não o ajudar muito, esclareceu qualquer coisa como isto:
Esta nota da Presidência destina-se a notificar a Imprensa.
A Imprensa procurou ultimamente explorar uma nota da Presidência para dar a entender que agimos com má fé ou preconceito contra quem quer que fosse.
Com efeito, aparentemente, não foram dezasseis Barragens que inaugurei este ano, mas dezassete. Não quis de todo ofender ninguém, especialmente a última barragem, que em meu entender, já tendo sido por mim visitada, não era propriamente a última, sendo no entanto mais uma das que visitei, num total de dezassete.
Algumas barragens foram visitadas duas vezes, pelo menos, mas outras ainda mais vezes, o que iria perfazer, feitas as contas, mais de uma vintena.
Contudo, como a penúltima já tinha sido visitada aquando da primeira pedra, não a considerei na altura, pois afinal já fora considerada. No fundo, a décima sexta é portanto a décima sétima, ou antes, a décima sétima é, mais precisamente, a décima sexta.
Só espíritos muito obstinados em não perceber é que insistem em não perceber aquilo que é perfeitamente compreensível, incluindo alguns jornalistas que puseram na minha boca ou na de algum dos meus colaboradores aquilo que nunca se disse.
Passou, com efeito, a informação de que eu inaugurara a décima sexta barragem, tal como referi, alias, no meu discurso, onde, no entanto, facilmente se perceberia que eu queria dizer décima sétima.
A bem da Nação, presta-se este esclarecimento, para que tudo fique esclarecido e nenhuma barragem se sinta diminuída na sua importância.
Era o princípio do fim. Nos idos de setenta, a coisa foi bazófia durante meses.
O Presidente estava efectivamente gagá.
Estórias da História, claro. Nada mais.
Etiquetas: PB
2 Comments:
E mais: esta é 1.ª vez que aqui estou depois da última vez em que aqui estive e qualquer concidência não pasa disso mesmo, mera coincidência. Disse.
Nesse discurso «esse» presidente acabou a pedir desculpa ao ministro por lhe ter pedido desculpa.
Enviar um comentário
<< Home