18.1.10

E noivos de fato-macaco?

Por Ferreira Fernandes

HÁ UNS ANOS, eu e outro jornalista resolvemos ir, de fato-macaco, comer ao Tavares, ao tempo o mais caro restaurante de Lisboa. A farpela ia limpa e marcámos reserva por telefone - não queríamos que motivos secundários impedissem o nosso objectivo. Esperávamos que surgisse aos olhos das massas a razão classista que nos barraria à porta: proletas não entram no templo gastronómico dos ricos.
A nossa entrada, discreta nos gestos mas tão inusitada no valor simbólico, silenciou aquele salão de espelhos. Acorreu o chefe de mesa: "Estamos cheios." Estarão, respondemos, mas nós temos reserva. Surgiu o patrão da casa: "Estes senhores dizem que têm mesa marcada", disse-lhe o empregado. Que levou com a resposta: "Se estes senhores têm mesa marcada, leve-os para a mesa marcada." E ficámos, os repórteres provocadores, com a reportagem desarmada...
Ah, se a Câmara de Lisboa e o Patriarcado tivessem o bom senso do patrão do Tavares! A Igreja ficava na sua: não deixando os gays chegar ao altar. A Câmara, na sua: o que é legalmente noivo, noivo é. E ambas acordavam para os noivos, gays e não gays, aquilo que é comum a César e aos céus: por exemplo, a bênção de Santo António.
E o mundo ficaria na mesma, tal como os proletas continuam sem ir comer ao Tavares.
«DN» de 18 Jan 10

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