Apague-se a História
Por Manuel António Pina
O CORPO de delito é esta linha, entre as 22 que integram a entrada da palavra "cigano" no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa: "5. pej[orativo], que ou aquele que trapaceia, velhaco, burlador". Pelo facto de o Houaiss ter informado os seus leitores que a palavra "cigano" é às vezes usada, na língua portuguesa, com o sentido pejorativo referido, um procurador brasileiro quer que a obra seja retirada de circulação e a editora pague 200 mil reais de indemnização por "semear a intolerância étnica".
É o método de recalcamento típico das hordas do politica e linguisticamente correcto: matar o mensageiro quando ele dá notícia de acontecimentos que... não deveriam ter acontecido. Tem sido tentado com os melhores: Mark Twain, Hergé, Steinbeck, Conrad, Melville, Malcolm Lowry... Haveria inevitavelmente de chegar a vez dos dicionários. Enquanto não chega (já faltou mais) a descafeinização das línguas de todos os usos e sentidos preconceituosos que nelas se foram acumulando ao longo dos séculos.
A língua portuguesa, por exemplo, seria limpa do uso de "judeu" ou "escocês" no sentido de avarento, "judiarias" no sentido de maldades, ou ainda de expressões como "trabalhar como um negro", "trabalhar como um mouro", "trabalhar como um galego", "gozar como um preto", etc.. Isto é, seria limpa da sua História. E, já agora, porque não limpar a própria História dos factos feios e deixar só os bonitos e "correctos"?
«JN» de 2 Mar 12O CORPO de delito é esta linha, entre as 22 que integram a entrada da palavra "cigano" no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa: "5. pej[orativo], que ou aquele que trapaceia, velhaco, burlador". Pelo facto de o Houaiss ter informado os seus leitores que a palavra "cigano" é às vezes usada, na língua portuguesa, com o sentido pejorativo referido, um procurador brasileiro quer que a obra seja retirada de circulação e a editora pague 200 mil reais de indemnização por "semear a intolerância étnica".
É o método de recalcamento típico das hordas do politica e linguisticamente correcto: matar o mensageiro quando ele dá notícia de acontecimentos que... não deveriam ter acontecido. Tem sido tentado com os melhores: Mark Twain, Hergé, Steinbeck, Conrad, Melville, Malcolm Lowry... Haveria inevitavelmente de chegar a vez dos dicionários. Enquanto não chega (já faltou mais) a descafeinização das línguas de todos os usos e sentidos preconceituosos que nelas se foram acumulando ao longo dos séculos.
A língua portuguesa, por exemplo, seria limpa do uso de "judeu" ou "escocês" no sentido de avarento, "judiarias" no sentido de maldades, ou ainda de expressões como "trabalhar como um negro", "trabalhar como um mouro", "trabalhar como um galego", "gozar como um preto", etc.. Isto é, seria limpa da sua História. E, já agora, porque não limpar a própria História dos factos feios e deixar só os bonitos e "correctos"?
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