O brasileiro e o seu Pessoa
Por Ferreira Fernandes
A MÁQUINA de escrever Royal e a escrivaninha de tampo de correr não
foram as parceiras de Fernando Pessoa na poesia. Foram usadas talvez
mais para ele escrever cartas comerciais, pois pertenciam a uma das
últimas empresas onde Pessoa trabalhou, a Sociedade Portuguesa de
Explosivos, no Largo do Corpo Santo, com nesgas do Tejo.
O brasileiro
João Paulo Cavalcanti Filho, que, há semanas, veio a Lisboa lançar o seu
livro Fernando Pessoa: Uma quase Autobiografia, pagou uma fortuna (mais
de 90 mil euros) por aquelas máquina de escrever e mesa de trabalho
usadas pelo empregado de escritório Pessoa e que ontem foram a leilão em
Lisboa. Com algum desdém dos nossos literatos mais puristas, Cavalcanti
Filho dedicara o seu livro mais ao homem (onde Pessoa mandava fazer, e
não pagava, os fatos e quanto usava de dioptrias...) e às pessoas do
seu pequeno mundo do que à obra genial. Mais, o brasileiro revelou que
muitas personagens dos versos existiram mesmo, encontrou-lhes nomes e
vidas. Assim, de A Tabacaria, ele diz-nos quem foi a pequena que comia
chocolates, quem era a lavadeira, o dono da tabacaria e o Esteves.
Agora, comprando objetos mais do empregado de escritório do que do
poeta, Cavalcanti Filho sublinha a coerência da sua paixão.
Haverá quem
pense que é desperdício tanta dedicação à pequena história do
escriturário Fernando Pessoa perante a grandeza dos seus versos. Esses
esquecem-se deste verso: "Come chocolates, pequena."
«DN» de 24 Mai 12 Etiquetas: autor convidado, F.F
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