O ataque suicida
Por Manuel António Pina
DO MESMO modo que, para um político, designadamente um governante, o
melhor modo de manter a sua imagem a recato é não ter no passado, e se
possível no presente, nada que o envergonhe (ou, não sendo ele de se
envergonhar, que envergonhe os seus eleitores), está visto que o
problema da independência dos jornalistas é terem vida privada.
Um jornalista com vida privada está sempre exposto a que um
político, designadamente um governante, o ameace de a revelar
publicamente. Eu, por exemplo, deixaria de escrever a maior parte destas
crónicas se um governante me ameaçasse que, caso continuasse a fazê-lo,
revelaria publicamente que ando com buracos nas meias, coisa que hoje
já todo o Governo deve saber pois falei disso ao telemóvel com a minha
empregada e o SIS está, como se sabe, na dependência directa do
primeiro-ministro.
A jornalista do "Público" que agora se queixa
de ter sido ameaçada pelo ministro Miguel Relvas com revelações sobre a
sua vida privada no caso de persistir em investigar as suas relações com
um certo (ou incerto) espião não se teria visto em tais apuros se não
se desse ao luxo de, além de vida profissional, ter vida pessoal.
A
modesta proposta que apresento à Comissão da Carteira Profissional é
que seja vedado aos jornalistas, de modo a blindar a sua independência
de ataques suicidas como o do "Público", ter vida privada.
«JN» de 22 Mai 12Etiquetas: MAP
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