5.8.12

As fundações da nacionalidade

Por Alberto Gonçalves 
UM RELATÓRIO sobre as fundações que por aí vicejam apurou um gasto estatal com as ditas de mil e quinhentos milhões nos últimos três anos. (...) Infelizmente, os senhores que nos tutelam não prometem o bom senso de entender que as fundações (falo das privadas; as públicas são uma redundância óbvia) só merecem o nome quando servem o meio envolvente e não quando se servem dele. Fundações sem rendimentos para mandar cantar um cego nem património que permita ao cego um gabinete decente não são exactamente fundações: são esquemas destinados a subtrair verbas ao Estado, consolar amigos, arrebanhar poder e catar o típico gabarito. 
Se um antigo presidente da República necessita de recorrer ao dinheiro alheio, o indivíduo não devia ter criado uma "fundação", mas um peditório à escala nacional ou um crédito bancário. Se o chefe de um governo regional usa a fundação social lá do sítio para comprar a casa onde o mesmo chefe viveu até aos 30 anos, é lícito supor que uma imobiliária teria maior vocação para o negócio. Se um escritor editado e vendido no mundo inteiro é obrigado a pedir abrigo à Câmara de Lisboa, convinha que os herdeiros do escritor pedissem contas ao contabilista. Se uma empresa de computadores embolsa 454 milhões para produzir uma geringonça inviável no mercado livre, constata-se que os empresários em causa escolheram a profissão errada. 
Sobretudo, constata-se que os contribuintes portugueses escolheram o país errado, na medida em que aqui se limitam a fazer jus ao nome e contribuir em prol do que outros decretaram ser o "bem comum". O comum é o bem de uns poucos acabar patrocinado pelos restantes. Nas fundações e em tudo, é assim que Portugal forma elites, que o dicionário define como os melhores de uma sociedade e que por cá não são apenas os que melhor vivem à respectiva custa. Nesta abençoada democracia, cada conceito beneficia de uma interpretação muito própria, "democracia" incluído. 
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
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Extracto da crónica «Momentos de Glória», publicada no «DN» de 5 Ago 12

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