23.11.12

Urgentes paliativos!

Por Joaquim Letria
HOUVE tempos, durante a ditadura, em que os jornais não podiam dar notícia de suicídios. Quando os jornalistas tentavam passar essa informação, a censura cortava. Dizia-se que era para que não se pensasse que havia gente infeliz naquele regime e com aquela vida. Mas acredito, também, que fosse para não servir de exemplo, na medida em que os suicídios, ainda hoje, parecem ser coisa contagiosa.
Para darem a entender que a morte dum fulano tinha sido consequência dum suicídio, os jornalistas escreviam, então, que o defunto tinha sido vítima dum seu “tresloucado acto”. Os psiquiatras explicavam que o conhecimento público de suicídios sugeria pessoas com angústias extremas, ou com fortes desequilíbrios mentais, que daquele modo encontravam saída para os seus problemas.
Escreveu Plínio que “entre as misérias da nossa vida, o suicídio constitui o mais apreciado dom que Deus concedeu ao homem”. Diz agora o economista francês Jean Paul Fitoussi, relativamente à crise, que “ as leis da economia são impiedosas e é preciso que nos adaptemos a elas, reduzindo as protecções de que ainda dispomos. Se vós quereis enriquecer, deveis aceitar previamente uma maior precariedade. Este é o caminho que vos levará ao futuro”.
Em meu entender, o que mais falta é a sustentabilidade moral do sistema. Portugal está atrasado a corrigir os seus condicionamentos sociais e económicos, a sua estrutura jurídica ultrapassada e anacrónica, resultado da totalmente desperdiçada década de 90. Uma das suas condicionantes negativas é sermos um país de proprietários e não de arrendatários, entre outras razões porque o mercado do crédito correspondeu à ideia patrimonial da sociedade portuguesa.
Hoje, para muitos portugueses, perder a casa é perder a identidade. Daí não termos dificuldades em entender o que levou aquela espanhola a saltar pela janela e matar-se durante a execução da acção de despejo do seu apartamento.
Por estas últimas razões, é urgente criar um paliativo a muitas situações dramáticas que a crise económico-financeira está a criar. Portugal não pode continuar, por muito mais tempo, numa textura psicológica tão tensa, tão crispada e instável como a que estamos a viver. É urgente criar válvulas de escape que aliviem a pressão que aumenta constantemente, ameaçando a ruptura completa.

Etiquetas: