A revolta de um simpatizante
JÁ HOUVE tempo em que me ria alto demais ao ler Les Aventures de Dieu (As
Aventuras de Deus), do satírico Cavanna; hoje, a rir-me, seria olhando
para o lado para não ofender alguém.
Não sou católico nem crente em
Deus, mas vivo bem com quem acredita.
Bento XVI acaba de lançar um
pequeno livro sobre, como diz o título, A Infância de Jesus. À dúvida
sobre a virgindade de Maria ("Jesus foi concebido por obra e graça do
Espírito Santo e nasceu da Virgem Maria?"), o Papa responde: "Sim, sem
dúvida."
Nem se me aflora um sorriso. Respeito as crenças dos outros
logo que não me atropelem, e as opiniões não atropelam. Aquele "sim, sem
dúvida" sobre um facto de que eu duvido, não é só que não me incomoda
(é mais do que a minha tolerância que é interpelada), tem de mim o
sincero apoio para que o Papa o diga. Aliás, ele devolve-me a boa
vontade colocando o assunto num terreno, o da fé, que não é o meu.
Ajuda-me a retirar-me da discussão.
Há, no entanto, um pequenino ponto
no novo livro que me incomoda. Bento XVI antes de o ser já era Joseph
Ratzinger, reputado teólogo, e gosta de colocar as coisas em alturas a
que não chego. No livro diz que na cabana onde nasceu Jesus "não havia
animais." Nem burro, nem vaca, pois. A minha corriqueira crença - dessas
sem epifanias nem êxtases mas sensível - sente-se ferida. E não aceito.
Nos meus Natais e presépios, de simples simpatizante, continuará a
haver a vaquinha e o burro.
«DN» de 22 Nov 12 Etiquetas: autor convidado, F.F
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