10.12.12

C r o n i c a n d o

Por Joaquim Letria
A CRÓNICA deveria ter um propósito nobre: falar do que mais ninguém fala e dar voz a quem não a tem. A comunicação social cala as coisas, silencia as pessoas e apaga a memória. A crónica deveria ser para que nada disso acontecesse.
Os bons cronistas devem ser subjectivos, emocionais, pretensiosos, rebarbativos e caprichosos. Os cronistas eram uma praga módica, mas agora são uma epidemia, com o mundo cheio de senhores e senhoras a quem chamam cronistas. Publicam-se antologias de crónicas, abundam cursos de escrita criativa dirigidos à crónica, aparecem teses a estudar a crónica, há workshops e cursilhos de crónicas. Dezenas de possibilidades e de perigos.
Há anos, os cronistas receavam a internet. Hoje, trocam dicas sobre como aproveitarem as redes sociais. É interessante conhecer verdadeiros cronistas um pouco por todo o mundo e descobrir que já  nenhum deles fala dos grandes media, jornais ou revistas, deste ou daquele país e em que moeda pagam, todos fugimos dos meios tradicionais para despontarmos em revistas amigas  ou surgirmos em blogues, essa nova folha de papel virtual onde deitamos os nossos textos.
A mim sempre me interessou que a crónica fosse um género marginal, uma opção, uma escolha à margem da principal corrente, uma RTP2 em vez duma RTP1,aquela que só vê quem quer, quando nada mais valia a pena ver.
 Por estas e por outras é que a crónica deve ser subjectiva, pretensiosa, fura-vidas, marginal, capaz de meter em crise as linguagens tradicionais, os estilos enganosos, os senhores e senhoras cronistas e este poder que os pariu.

Etiquetas:

1 Comments:

Blogger José Batista said...

Cursilhos, sim senhor.
E diplomados em cursilhos, à semana e ao domingo, por equivalências com base em "funções" e "experiências", com pós-graduações antes das graduações, orientados por/GPS(s) muito operativos em direção ao nosso bolso e... à nossa alma.
São os que, cronicamente, têm lavrado a nossa vida. E nos vão "cronicando".
Servidos por muitos senhores e senhoras cronistas que não só os pariram como diligentemente os lambem.
Arranjámo-la bonita!

11 de dezembro de 2012 às 10:03  

Enviar um comentário

<< Home