Isto em caso de ser manchete inocente
Por Ferreira Fernandes
AINDA um voto: que os jornais façam mais política. Foi o que mais
faltou recentemente a um jornal: capacidade de fazer política pesando os
prós e contras. Manchete do Expresso, em novembro: "Procuradoria abre
inquérito a altos governantes angolanos." Sim, a Procuradoria abrira
inquérito a altos governantes angolanos e o jornalismo existe para dar
notícias. Portanto, que se desse aquela. Mas o jornalismo é também
escolha, hierarquização do mais importante. E aquela notícia nunca
mereceria ser manchete, mas só uma breve: era um facto burocrático da
nossa Justiça, obrigada a receber uma queixa sem possibilidade, porque a
nossa Justiça está impedida de investigar em Angola, de outro fim senão
arquivamento. E vai ser arquivada. Entretanto, a manchete serviu de
facto em si mesma, para lá do facto que noticiava. Entre tantas coisas
irrelevantes que vão para primeira página, aquela podia ser mais uma.
Mas não era, aquela manchete do Expresso não foi gratuita. Pelo seu
relevo inusitado causou um conflito com um país com o qual, não só pelos
nossos interesses financeiros de momento mas por razões históricas,
devemos aprofundar laços. Em nome da informação, podemos esquecer outros
interesses, e até os nacionais - mas, nesse caso, conviria que a
informação valha a pena. Com informações da tanga, prejudicarmos tanto é
estúpido. Fazendo política, pesando os prós e contras, aquela manchete
faria bom jornalismo: deixaria de existir.
«DN» de 2 Jan 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
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