Socialismo: procura-se e deseja-se?
Por Baptista-Bastos
AO CONTRÁRIO do que dizem línguas bífidas, o conclave de Coimbra, que
reuniu distintos socialistas e alguns menos distintos, forneceu certos
motivos de reflexão. Exactamente pela circunstância de nada de relevante
haver servido de pábulo a uma Imprensa tão deserta de ideias quanto a
melancólica vida geral portuguesa. Os jornais desejavam zaragata: o
previsível "duelo" entre Seguro e Costa foi água chilra. António Costa
saiu apoiando um triste documento de intenções, cujas essas, as
intenções, eram alegremente nulas. Apelidado, apressadamente, de
Documento de Coimbra, o virtuoso testemunho (diz-se por aí) devorou
horas a graves pensadores do PS e nada exprime que suscite um debate, um
sobressalto, uma inquietação, uma expectativa. Seguro pode descansar.
Costa, muito astuto e politicamente mais preparado, fez umas negaças,
recreou correligionários cabisbaixos com o rumo do PS, recuou e aguarda o
momento propício para atacar de frente. E este não é o momento. Ninguém
sabe quando o será, acaso nem o próprio Costa. Afinal está a proceder
como Seguro o fez com Sócrates. Histórias de chacais emboscados. Saiu de
Coimbra caído nos braços do secretário-geral, e muito feliz com aquela
miséria toda. Quem estará realmente interessado em dirigir uma nave de
loucos? Todos aguardam, nenhum sabe bem o quê.
Passos Coelho
prossegue na tarefa de demolição a que se propôs. Ignora que não se
altera um Estado e as suas estruturas sociais, culturais e morais com
contas de subtrair. Galbraith, hoje esquecido, provou-o com os exemplos
do nazismo e do fascismo. É impressionante a desfaçatez com que este
homem nos mente, falando como quem se dirige a mentecaptos. 17 por cento
de desempregados não o comovem nem demovem. Ameaça que a praga não vai
parar. Estamos a morrer como pátria, como nação e como povo mas coisa
alguma emociona estes macacos sem fé e sem sonhos. Ri, alarvemente, com o
Vítor Gaspar ("um génio" na expressão dessoutro "génio", António
Borges), e chega a ser comovente o preguiçoso desdém com que Paulo
Portas é tratado pela parelha.
Chegados a este ponto, é lícito
perguntar: até onde a democracia pode admitir e sustentar estas
indignidades? E onde pára o dr. Cavaco?, auto-omitido por natureza, mas
obrigado, pelas funções constitucionais, a fazer algo que impeça a
ruptura total. E os socialistas, que "socialismo" ambicionam, se é que
ambicionam algum "socialismo"? E, depois de Mário Soares o ter colocado
na gaveta, não sufocou definitivamente?
A tempo: confesso-me
extremamente sensibilizado com as manifestações de simpatia e, até, de
estima, por mim recebidas, durante uns percalços de saúde que me
obrigaram a hospitalização. Uma vez ainda, a minha gratidão a todos, e à
mística de humanismo de todos aqueles que trabalham e defendem o
Serviço Nacional de Saúde. Bem hajam!
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.«DN» de 20 Fev 13
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