14.4.13

O que é a Felicidade?

Por Maria Filomena Mónica 
NOS INTERVALOS do debate sobre o irresolúvel conflito na Síria, a ONU decidiu criar o «Dia Internacional da Felicidade» celebrado este ano pela primeira vez no passado dia 20. A ideia, originária do reino budista do Butão, destina-se a reconhecer «a felicidade e o bem-estar como objectivos universais para a vida da Humanidade». O Secretário Geral da ONU espera que, através desta celebração, seja «reforçado o compromisso para com o desenvolvimento inclusivo e sustentável do ser humano», uma vez que, na sua opinião, o mundo necessita de «um novo paradigma económico que reconheça a igualdade dos três pilares do desenvolvimento sustentável», isto é, os aspectos económicos, sociais e ambientais. Resta lembrar que, em vez do conhecido PIB - no qual figura bastante abaixo – o Butão adoptou como estatística oficial a «Felicidade Nacional Bruta».
Dos economistas, sociólogos e organizações internacionais, estou à espera de tudo. Por isso não me espantei quando vi publicada nas revistas da especialidade os resultados de sondagens destinadas a medir a felicidade dos povos. Se, no caso individual, medir uma coisa tão subjectiva quanto a felicidade é impossível, imagine-se o absurdo de fazer cálculos para apurar a felicidade das nações.
Apesar disso, no dia comemorativo, fiquei a reflectir sobre o assunto. Dado que outras coisas, como um interruptor eléctrico estragado, me preocupavam mais, acabei por esquecer a questão metafísica. Eis que, passados três dias, li no Diário de Notícias uma entrevista a um casal, vivendo numa aldeia isolada do concelho de Moncorvo, que me fez voltar ao tema. Em tempos antigos, o povoado fora relativamente próspero, mas depois as pessoas começaram a partir e os mais velhos a morrer. Maria de Jesus Rodrigues, de 81 anos, e o marido, Francisco Lemos, de 82, eram agora os seus únicos habitantes. 
O casal tinha tudo – a pobreza, o isolamento, o analfabetismo – para ser infeliz, mas as respostas demonstravam o contrário. Eis o que Maria de Jesus disse: «O que morreu hoje era meu irmão, mas o desgosto não é muito, porque estamos na idade de partir». Após o que acrescentava: «Vou ficando por cá, com o meu marido, de quem gosto muito». E depois: «Os nossos seis filhos estão longe, mas, de vez em quando, vêm cá». Em tom carinhoso, ele complementava: «Cá me vou entretendo com a patroa, amparamo-nos um ao outro e vamo-nos entretendo com a horta, as vinhas e as oliveiras». Depois de contar que o carteiro tinha a amabilidade de lhes ler as cartas recebidas, concluía: «Somos felizes, porque estamos no nosso cantinho, só nós dois». 
Estas vozes, sem dúvida comoventes, pertencem um universo cujo fim não lamento. No que me diz respeito, sei exactamente por que não sou feliz. Quis sempre mais da vida, incluindo «as impressões fulminantes» de que falava Camilo, do que ela tinha para me oferecer. Ban Ki-moon bem pode esforçar-se: comigo, a coisa não pega. 
«Expresso» de 30 Mar 13

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1 Comments:

Blogger Laura Cachupa Ferreira said...

A felicidade é, não ler os textos da Mónica.
Deve falar no doutoramento em Oxford.
Acertei?

14 de abril de 2013 às 11:20  

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