6.8.13

Capitalismo, Caridade e Justiça

Por Maria Filomena Mónica
AO LONGO da vida, fui sujeita a várias trilogias. A primeira, a católica, consagrava as virtudes teologais, a Fé, a Esperança e a Caridade. Mal espreitei o que rodeava o meu berço, a Esperança sumiu-se; por razões ligadas ao sexo, perdi a Fé; durante alguns anos, fiquei com a terceira virtude, a Caridade. A segunda trilogia foi a da Revolução Francesa - a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade - que comigo permaneceu até descobrir que por ali se podia acabar no totalitarismo.
Vivendo sob um regime autoritário, não me é difícil entender o motivo que me fez, e faz, prezar acima de tudo a Liberdade. Já quanto ao outro terceiro princípio, a Caridade, a coisa é complicada. À medida que crescia, a forma como os católicos exerciam esta virtude começou a perturbar-me. Ainda que, à altura, não fosse capaz de o exprimir, percebi que a sopa fornecida nas escadas de serviço, os pares de sapatos dados ao mendigo que batia à porta ou o enxoval de bebé oferecido às grávidas pelo Natal não serviam para anular a miséria de um país governado por um beirão que acreditava, ou fingia acreditar, que «pobres sempre os tereis entre vós». É certo que, como todos os textos sagrados, o Evangelho exibe recados contraditórios. Veja-se o que surge, na boca de Cristo, em Mateus, 19, 23/4: «Em verdade vos digo que dificilmente entrará um rico no reino dos céus». Mas isto não me ajudou, porque, os católicos, sempre que viam uma mão estendida, optavam pelo «Tenham paciência».
Já me tinha esquecido de tudo isto, quando, numa reportagem do último Expresso sobre a Herdade da Comporta, voltei a cruzar-me com alguns apelidos que fizeram parte da minha juventude. Note-se (quantas vezes terei de o afirmar?) que admiro ou desprezo indivíduos e não grupos sociais. Mas há frases que se colam a quem as diz. Estava eu a olhar as fotos daquele Paraíso com melgas, quando me deparo com a entrevista a uma jovem de 44 anos, que contava ao jornalista como frequentara aquela praia antes de a Revolução ter nacionalizado os terrenos da família, os Espírito Santos, e como, em 1993, ali comprara ali uma casinha rústica, mantendo a simplicidade original, o que a fazia sentir em estado mais puro: «É como brincar aos pobrezinhos». Como é possível dizer tal coisa? Ou antes, como é possível pensar tal coisa?
A certa altura, ainda acreditei que a substituição da caridade à latina pela filantropia à anglo-saxónica constituiria um progresso, mas a coisa não pegou: nem na minha alma, nem na realidade. Até porque, nos EUA, enquanto os filantropos corriam de um lado para o outro, doando uma parte dos lucros acumulados, a desigualdade social permanecia igual ou aumentara. A solução não consiste em abolir o Capitalismo, mas em ressuscitar um ideal esquecido, a Fraternidade. Um tempo houve em que o mundo aceitou a escravatura como a coisa mais natural do mundo. Até que, um dia, a considerou moralmente indigna. Por isso acredito ser possível lutar por que a justiça social seja reconhecida como princípio organizador das nossas sociedades.  «Expresso» de 3 Ago 13

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1 Comments:

Blogger Manuel Tiago said...

Um chorrilho de disparates do princípio ao fim.
A Mónica no seu melhor.
Perdeu a fé pelo sexo em si ou pelo sexo a que pertence?
Com o sexo costuma perder-se a virgindade, mas, há sexo e sexo.

PS
Medina Ribeiro - só escrevi este comentário porque sei que você não o transmite à Mónica

José Baptista - gostava de saber a sua opinião sobre este tema escaldante da perda da fé pelo sexo.
Pior só a perda da fé no sexo...

6 de agosto de 2013 às 15:28  

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