2.12.13

Carta aberta da gaiola enferrujada

Por Ferreira Fernandes
Os portugueses não deveriam dar conselhos aos ucranianos sobre os alemães. Contas feitas, foi há mais de mil anos que os suevos e os visigodos nos inquietaram, enquanto os ucranianos já tiveram problemas bem mais recentes com a falta de espaço vital dos germânicos. Os ucranianos deviam ser, mais do que nós, especialistas dessa tão necessária arte europeia de saber tratar com aquele perigo. No entanto, estando, como estamos, do lado de dentro da armadilha, e vendo o frenesim com que Kiev se agita - "deixem-nos entrar, deixem-nos entrar!" -, exige a generosidade que digamos: calma. Escutem Viktor Ianukovich, o vosso Presidente, que teve o bom senso de qualquer dona de casa. Ele foi ao mercado, na loja do russo ouviu a oferta de gás, na quitanda da Merkel ouviu a promessa de sociedade, e decidiu bem. Optou pelo russo e não fechou as portas aos alemães. Foi medida prudente, não tanto porque não vale de nada fechar a porta aos alemães (não, já não é com Panzers que eles entram e, no entanto, entram), mas porque ganhar tempo e renegociar é essencial se quiserem ser mais do que sócios de segunda. Desde logo, deixem-nos lembrar com a sabedoria dos vencidos que vocês não negociavam para entrar na UE, mas para serem súbditos da dona da coisa. Adiando e obrigando-a a insistir, vocês conseguem mostrar que a Alemanha precisa dos outros. E talvez vocês consigam que até nós, de dentro da gaiola enferrujada, nos possamos dar conta desse facto.
«DN» de 2 Dez 13

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