19.1.21

“Nova Costa d’ Oiro” de Janeiro 2021

SE PERGUNTAMOS a um investidor estrangeiro porque é que hesita em meter o seu dinheiro em Portugal, ele certamente referirá a burocracia, a lentidão da Justiça, a corrupção... e por aí fora, numa enumeração de obstáculos que o Estado se esmera em criar. Claro que a gravidade dessas limitações depende do que estiver em causa, mas eu estou a pensar, agora, na campanha de vacinação contra a Covid-19, que obrigará a um esforço inaudito para gerir quantidades gigantescas de informação e de meios, envolvendo MILHÕES de pessoas: e não fico nada tranquilo ao pensar que, durante todo esse processo, as nossas vidas estarão dependentes da eficácia de um Estado que é tão bom a inventar problemas quanto é péssimo a oferecer soluções — para exemplificar os que eu escolhi três pequenas rábulas “caseiras”.

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I — QUANDO, em tempos, me mudei para Lagos e requeri a isenção de IMI a que tinha direito, vim a saber que fora recusada porque a casa constava, nas Finanças, como sendo numa determinada urbanização, enquanto eu indicara o nome da rua que se via nas placas toponímicas — uma descoordenação que eu até poderia relevar se, em seguida, não tivesse de ser eu a deslocar-me à CML para pedir uma certidão dessa equivalência! E o pior foi quando se aproximou a data-limite para pagar o imposto, o que me obrigou a voltar lá para PEDIR que apressassem “o processo” — e a resposta foi que não se podia fazer nada, e até poderia demorar 90 dias! Sucedeu que, nutrindo eu uma profunda aversão à burocracia, já antes tinha encomendado a uma solicitadora que tratasse de tudo o que pudesse — e foi ela que, si lá como!, conseguiu obter o certificado em tempo útil.

 

II — EM JUNHO de 2019, ao passar à porta da nossa Conservatória, enchi-me de coragem e decidi renovar o Cartão de Cidadão. Pois, apesar de não haver qualquer alteração em relação ao anterior, fui brindado com uma espera de seis horas até ser atendido, acrescidas de três quando o fui levantar — porque, entre outros absurdos cujos detalhes aqui omito, o envio para casa não era possível. Quando, por fim, me apanhei com o cartãozinho na mão, fiz questão de perguntar se “eles” também passavam por esse inferno, o que me valeu uma resposta bem esclarecedora: «Claro que não!».


III — TODA a gente sabe que a factura electrónica é algo que só tem vantagens, quer para quem a emite, quer para quem a recebe e, obviamente, é nesse formato que eu recebo as facturas do gás, da electricidade e das telecomunicações, bem assim como as comunicações de bancos, companhias de seguros e tudo o mais... com uma gloriosa excepção: a factura do SMAS de Lagos, que continua a chegar-me em papel! Sim, trata-se de um absurdo que remonta a Outubro de 2019, quando recebi em casa um folheto anunciando que essa possibilidade já estava disponível, para o que me eram oferecidas nada menos do que quatro formas para a passar à prática. Optei pela segunda, e esperei... Até hoje! Claro que o ‘e-mail’ foi recebido, mas ainda ninguém aprendeu, lá nos serviços, que é da mais elementar ‘netiqueta’ acusar a recepção das mensagens — e que, caso alguma coisa não esteja bem, o remetente deverá ser informado disso.

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NESTES, como em muitos outros casos semelhantes, houve sempre quem me aconselhasse a reclamar — sugestão muito louvável, mas vinda de quem nunca o fez contra serviços públicos pois, quanto a mim, conto pelos dedos de uma mão os casos em que as minhas reclamações foram atendidas. Aliás, e quando o que está em causa é a burocracia de um Estado arrogante, o melhor a fazer é recordar Jô Soares que, encolhendo os ombros, nos lembrava que «Burocrata tem de viver...».

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