LÍNGUA FRANCA
Por Joaquim Letria
Deixámos de andar e de correr para passarmos a fazer “footing” ou “jogging”. Abandonámos a vela e a prancha para praticarmos “sailing”,”surfing” e “windsurfing”.
Deixámos de andar ao sabor da maré em cima duma prancha para passarmos a fazer “planting”. Reunimo-nos em “meetings”, discutimos os nossos problemas em “brainstormings”, avaliamos o nosso conhecimento em “tests” escritos e orais, depois de termos abandonado os pontos ou as chamadas.
Nas empresas, onde já não há trabalhadores mas sim colaboradores, deixámos de despedir gente e cortar nos custos para passarmos a fazer o “downsizing”. Parámos de recorrer a serviços externos ou a parcerias para nos dedicarmos ao “outsourcing”, trocámos as diferenças de nível pelo ” super – in” “benchamarking”.
Aquilo que eu tanto gostava de fazer em Los Roques, Venezuela, ou no Cayo Largo, Cuba, e que era respirar por um tubo e ver por uns óculos de mergulho, passando horas seguidas a dar às barbatanas, a ver ou a filmar peixes às cores, às riscas ou às bolinhas, passou a ser uma actividade que dá pelo nome de “snorkling”.
“Snorkling” não é para qualquer um! Encontrei numa estreia uma dessas divas das nossas revistas cor de rosa com um bronze invejável. Julguei que viesse do Brasil, ou de África, mas disse-me que não senhor. Tinha estado com o seu PT (o nosso antigo treinador ou instrutor agora promovido a “Personal Trainer”) no Mar Vermelho, o qual, segundo me confidenciou, para fazer “snorkllng” não era alucinante, era “mega-super-alucinante!!” Com uma flauta de espumante na mão atirou-me um beijo e foi conviver, quero dizer foi “wordlng” e “worlding” para o meio da refinada e elegante multidão.
Nessa mesma ocasião encontrei a filha dum amigo meu, muito mais pálida do que a mulher-rã, que não gostava de “snorkling” mas “era marada por diving”.
Nessa época eu andava muito ocupado com as minhas absorventes actividades de
“counselling”, “teaching”, “travelling” e “writing”. Talvez por isso descuidara estas garoupas tão interessantes que iam às profundezas com os PTs para conhecerem o linguado do Mar Vermelho ou admirarem de perto o lingueirão do Mediterrâneo.
Por estes escassos e singelos exemplos, conclui-se que falar línguas é bacana,
acojonante, swell, fantastique , baril, do caneco, bué da fixe. No fundo, a tal língua portuguesa serve só para ser assassinada em acordos miseráveis que todos assinam mas ninguém pratica, a não ser para dar pontapés na gramática.
Publicado no Minho Digital
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